segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Para meditar


O hábito da meditação é um dos mais saudáveis que se pode desenvolver e que recomendo a todas as pessoas inteligentes e positivas, notadamente às que, como nós, lidam com ideias, conceitos, informações e sentimentos, ou seja, escritoras. Não digo que o sujeito deva ser um Sidarta Gautama da vida, que passe dias e mais dias mergulhado em profunda meditação em busca da iluminação. Há tantas outras coisas importantes a se fazer, das quais a principal (e óbvia) é viver.

Meditar por cinco minutos, diariamente, de preferência logo após o despertar, está de bom tamanho. A maioria nem isso faz. Há pessoas que evitam pensar –, aliás, na verdade, se recusam terminantemente de fazer isso – de medo dos próprios pensamentos. Não sabem o que pode emergir do subconsciente para o consciente e, por tal razão, preferem não arriscar. Tolice. É estranho se ter medo de si próprio, contudo muita gente tem.

Há quem aja como se pensar fosse lhe causar insuportável dor. Não, amigo, pensar não dói. Aliás, pelo contrário, alivia, quando não extingue, as dores emocionais. Dos que têm esse saudável hábito diário (entre os quais me incluo, costume que adquiri há bem mais de seus cinquenta anos e que se incorporou à minha rotina diária, como tomar banho, barbear-me, escovar os dentes e assim por diante), muitos meditam sobre o primeiro tema que lhes vem à cabeça.

Talvez em decorrência da longa prática, sou mais eclético nesse sentido. Às vezes, deixo, de fato, a mente divagar, até que algo, interno ou externo, me chame a atenção e faça com que concentre todo meu foco ali. Em outras oportunidades, porém, escolho o livro de algum dos meus poetas preferidos (em geral, Quintana, Drummond, Bandeira, Victor Hugo ou Charles Baudelaire), abro-o a esmo, em algum poema, ao acaso, e medito sobre o seu teor.

Há já bom tempo, o companheirão mais fiel das minhas manhãs é o meu saudoso amigo Mauro Sampaio. Ele faleceu há mais de dez anos, mas sua alma está vivíssima nos livros que nos legou. E “dialogo” com ela, por estes benditos cinco minutos diários, que valem não por horas, mas até por meses e anos. Quanta coisa aprendi, sobretudo a meu próprio respeito, com esse sábio e sensível amigão!

Dos seus livros, o que mais utilizo para esse fim é uma pequena brochura, editada pela Academia Campinense de Letras, da qual sou membro desde 1992 e que ele presidiu, intitulado “Poemas para meditar”. Como se vê, Mauro escreveu especificamente para pessoas que, como eu, têm o hábito da meditação. E é uma delícia refletir sobre a sua poesia.

Aliás, por incrível que pareça, esse gênero é particularmente recomendado para editores, que têm necessidade diária de fazer títulos para as matérias que editam. Não acreditam? Podem crer que essa leitura funciona! Quem é do ramo sabe da importância (e das dificuldades) da titulação. Um bom título pode salvar matéria ruim, mas o inverso é verdadeiro. Ou seja, um que seja infeliz, mata no ninho a melhor das reportagens. Conversando, há alguns anos, a esse propósito, com o saudoso Cláudio Abramo, ele recomendou que eu lesse mais poesia (e eu já lia muita) para facilitar meu trabalho de editor. E não é que a coisa funcionou!!!

Desde então, passei a ler mais e mais livros do gênero, agora por três motivos. O primeiro, para condicionar minha mente a elaborar títulos precisos, criativos e proporcionais às matérias que edito. O segundo, como fonte de meditação diária. E o terceiro, para meu deleite pessoal, já que nasci poeta, que poesia foi o primeiro tipo de texto que escrevi na vida e é o que mais sei fazer, embora minha especialidade literária seja o conto.

Bem, acabei escrevendo, escrevendo e escrevendo, divagando, divagando e divagando e, por conseguinte, fugi do tema central destas considerações. Ou seja, violei a norma básica da meditação, que é a de se concentrar num assunto específico e, se preciso, virá-lo no avesso, sem deixar o pensamento escapar para outro. É essa espécie de autodisciplina, aliás, que se constitui no principal mérito desse exercício.

Como enfatizei muito a importância da poesia de Mauro Sampaio, não poderia deixar de partilhar com vocês um dos poemas desse inspirado (e sábio) poeta. O escolhido foi “Vale a pena o pensamento”, que diz:

Vale a pena o pensamento.
Vale a pena o apanhar borboletas
ao mesmo tempo em que se olha a alma
e se examinam as coisas e os atos.
E tenho o mundo todo,
todos os horizontes abertos
todos os mistérios desvendados!
E estou vivo e morto,
sou o que desejo e não aceito.
Feliz por chegar de manso
na penumbra da desgraça
e da vingança.
Penetro nas guerras,
e por misericórdia acabo-as de um só golpe:
extermino com toda a humanidade”.

Por esta amostra, dá para entender a minha preferência pelos poemas de Mauro Sampaio para “gatilhos” da minha meditação? Viram por quantos assuntos ele bosqueja, menciona de passagem, como que não querendo nada, mas querendo demais? Claro que não me valho, como já mencionei, só desse poeta para meditar e não alimento meus neurônios só de poesia. Mas que ela confere nobreza e transcendência à meditação, não tenho a menor dúvida. Experimente fazer isso e, para o bem da sua sanidade mental e espiritual, faça disso um hábito. Verá como os dias (mesmo aqueles bem “hard”) tornam-se mais leves e a vida adquire bem mais cor.

Boa leitura!


O Editor.

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