domingo, 13 de agosto de 2017

Exaustão


* Por Flora Figueiredo


Eu queria tanto, tanto
que arrisquei todas as maneiras
e todos os feitiços.
Pedi até ao santo
que andava de muito
meio omisso
e no ardor da reza,
até chorei.
Só que santo não se comove
com lágrimas de fiel;
acho que lá do céu
é difícil avaliar a extensão
da corrosão da água corrente.
(Mas mesmo assim eu permaneço crente.)
Desapontada, tentei a encruzilhada,
o guru,
a cartomante.
Como não fosse o bastante,
passei a ter sempre à mão
frases de efeito contundente
e poder de convicção.
Abusei do pensamento positivo:
tudo serviu como lenitivo.
Num compasso de cansaço
e frustração,
vou carregando agora a sensação
de finitude.
... porque te amei muito mais do que te pude. 




In Calçada de Verão, 1989 


* Poetisa, cronista, compositora e tradutora, autora de “O trem que traz a noite”, “Chão de vento”, “Calçada de verão”, “Limão Rosa”, “Amor a céu aberto” e “Florescência”; rima, ritmo e bom-humor são características da sua poesia. Deixa evidente sua intimidade com o mundo, abraçando o cotidiano com vitalidade e graça - às vezes romântica, às vezes irreverente e turbulenta. Sempre dentro de uma linguagem concisa e simples, plena de sutileza verbal, seus poemas são como um mergulho profundo nas águas da vida. 




Nenhum comentário:

Postar um comentário