Amor sem ciúme não é amor
* Por
Celamar Maione
Liciane enxugava as lágrimas
com as mãos, quando a mãe entrou na sala.
- Está chorando? Aconteceu
alguma coisa?
-Li no jornal a história do
namorado ciumento que matou a mulher amada com cinco facadas .
-Mais um crime passional.
Coisa horrível! –, comentou a mãe.
-Horrível, não! É lindo
matar ou morrer por amor!
-Isso não é amor. É
loucura.
-Ah, mãe, amor que é amor
tem que ter uma dose de loucura, brigas e ciúmes. Adoro cenas
dramáticas. Gosto de viver perigosamente.
-Você tem cada uma, minha
filha!!
A conversa foi interrompida
pelo som do telefone. Era Tavinho. Namoravam há dois anos. Ele
desejava casar, mas Liciane andava desanimada com o relacionamento.
Acreditava que Tavinho não a amava o suficiente. Faltava na relação
a emoção que ela tanto queria viver. Liciane achava tudo certinho
e monótono demais. Por isso, vivia questionando os sentimentos do
futuro noivo.
-Você me ama?
-Amo.
-Então por que não sente
ciúme?
-Confio no meu taco. Você não
confia no seu?
Aos poucos, os questionamentos
de Liciane viraram obsessão. Quem escutava seu desabafo era a amiga
de infância Noêmia:
-Não me ama. Se me amasse me
proibiria de sair de casa. Não me deixaria olhar para outro homem.
Sentiria ciúme. Desconfiaria.
-Você queria que ele fosse
como o Walfrido? Vive me regulando pelo celular. O que você tem na
cabeça? O Tavinho confia em você.
-Sou romântica. Acho o máximo
morrer de amor! Matar por amor! Imagina, assassinada na Avenida
Presidente Vargas! Saíria em todos os jornais: “Noivo enciumado
mata noiva com três tiros”. Ficaria famosa.
-Famosa depois de morta? Vou
mandar sua mãe levar você ao psiquiatra.
Liciane estava disposta a
testar o amor de Tavinho. Levou-o na consulta ao ginecologista para
fazer-lhe ciúme.
-Me espera aqui fora, enquanto
vou me consultar.
-Espero.
-Não quer entrar?
-Pra quê? Isso é coisa de
mulher.
-Mas o ginecologista é novo,
bonito e mulherengo!
-Confio em você.
Liciane se frustrou e
desabafou com o médico:
-Meu namorado não quis
entrar. Todo namorado quer acompanhar o exame ginecológico da
namorada.
-Deveria se orgulhar. Sinal
que seu namorado respeita você.
-É um banana, doutor. É
capaz de me entregar de bandeja para outro homem. Não me ama. Se me
amasse sentiria ciúme. Faria um escândalo. Sou feia, doutor? Me
diga, sou feia?
-Com todo respeito, você é
uma mulher muito bonita. Seu corpo é perfeito. Qualquer homem se
orgulharia de ter você como namorada.
Quando saiu da consulta
encontrou Tavinho lendo revista . Ainda tentou provocá-lo.
-O Doutor Adalberto disse que
sou uma mulher linda. Que todo homem teria orgulho de me namorar.
Tavinho não se abalou.
-Ele tem razão. Você é uma
mulher linda, por isso vamos nos casar.
Liciane mordeu os lábios e se
ressentiu com a suposta indiferença de Tavinho. Ela pensou que ele
não era como os outros homens. Nunca fazia cena de ciúme. Sentia
por ela um profundo descaso. Na festa de aniversário de Noêmia,
Liciane, mais uma vez, tentou fazer ciúme em Tavinho. Dançou com
todos os rapazes. Como ele não gostava de dançar, ficou conversando
com Walfrido:
- Você dá muito mole. Deixa
a Liciane se esfregar com outros caras.
-Se esfregar, não, dançar. E
se ela não quiser ficar comigo é só terminar o namoro. É um
direito dela. Está comigo porque quer.
-Vai pensando assim. Quando
casar vai ser corno. Trato a Noêmia no laço, não dou folga. Se me
cornear já sabe, mato!
Foram pra casa brigando.
-Você não me ama. Me deixou
dançar com todos os homens da festa e não fez nada.
-Dançar não arranca pedaço.
E todos na festa sabem que vamos nos casar.
-Casar? Como vou casar com um
homem que não sente ciúme de mim?
-O que você quer? Que faça
um escândalo? Grite? Bata em você? Não é meu estilo. Não sou
de briga.
Os ataques de Liciane já o
estavam deixando sem paciência. Não entendia as atitudes da mulher
com quem pensava casar. Quando no Domingo, disse a Liciane que não
passaria na casa dela, para ir ao Maracanã, ver a decisão do
campeonato, o mundo veio abaixo.
-Domingo?! Vai me deixar
sozinha?!
-Futebol é sagrado. Hoje é
decisão de campeonato. Não perco por nada.
Revoltada, e se sentindo
rejeitada, gritou:
-Vai me pagar, Tavinho! Quero
ver se não vai sentir ciúme de mim dessa vez! Quero ver! Vou
chamar a atenção de todo mundo! Vai ter que tomar uma atitude!
Tavinho não se importava com
as ameaças de Liciane. Para ele, decisão de campeonato era mais
importante do que os caprichos da namorada. Adorava ver o Maracanã
lotado. Quando o juiz deu início à partida, entrou em êxtase .
Dez minutos depois de iniciada, quando o jogo começava a esquentar,
uma mulher nua invade o gramado. Tavinho reconhece logo. Era
Liciane. Surpreso com a atitude desvairada da namorada foi embora
do estádio, envergonhado diante da gozação dos amigos. Enquanto o
estádio gritava, em coro, “Gostosa, gostosa, piranha, piranha”,
Liciane era retirada do gramado por dois seguranças.
Acabou trocando o amor sem sal
de Tavinho, pela fama meteórica. Contou a história de sua nudez
para rádios, jornais e programas de fofoca televisivos. Além disso,
posou nua para revistas masculinas e passou a cobrar cinco mil reais
para permanecer meia hora nas festas de famosos.
Radialista e jornalista,
trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA,
Tropical e Rádio Globo.
Quem entende o amor?
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