sábado, 8 de julho de 2017

Amor sem ciúme não é amor


* Por Celamar Maione


Liciane enxugava as lágrimas com as mãos, quando a mãe entrou na sala.
- Está chorando? Aconteceu alguma coisa?
-Li no jornal a história do namorado ciumento que matou a mulher amada com cinco facadas .
-Mais um crime passional. Coisa horrível! –, comentou a mãe.
-Horrível, não! É lindo matar ou morrer por amor!
-Isso não é amor. É loucura.
-Ah, mãe, amor que é amor tem que ter uma dose de loucura, brigas e ciúmes. Adoro cenas dramáticas. Gosto de viver perigosamente.
-Você tem cada uma, minha filha!!

A conversa foi interrompida pelo som do telefone. Era Tavinho. Namoravam há dois anos. Ele desejava casar, mas Liciane andava desanimada com o relacionamento. Acreditava que Tavinho não a amava o suficiente. Faltava na relação a emoção que ela tanto queria viver. Liciane achava tudo certinho e monótono demais. Por isso, vivia questionando os sentimentos do futuro noivo.
-Você me ama?
-Amo.
-Então por que não sente ciúme?
-Confio no meu taco. Você não confia no seu?

Aos poucos, os questionamentos de Liciane viraram obsessão. Quem escutava seu desabafo era a amiga de infância Noêmia:
-Não me ama. Se me amasse me proibiria de sair de casa. Não me deixaria olhar para outro homem. Sentiria ciúme. Desconfiaria.
-Você queria que ele fosse como o Walfrido? Vive me regulando pelo celular. O que você tem na cabeça? O Tavinho confia em você.
-Sou romântica. Acho o máximo morrer de amor! Matar por amor! Imagina, assassinada na Avenida Presidente Vargas! Saíria em todos os jornais: “Noivo enciumado mata noiva com três tiros”. Ficaria famosa.
-Famosa depois de morta? Vou mandar sua mãe levar você ao psiquiatra.

Liciane estava disposta a testar o amor de Tavinho. Levou-o na consulta ao ginecologista para fazer-lhe ciúme.
-Me espera aqui fora, enquanto vou me consultar.
-Espero.
-Não quer entrar?
-Pra quê? Isso é coisa de mulher.
-Mas o ginecologista é novo, bonito e mulherengo!
-Confio em você.

Liciane se frustrou e desabafou com o médico:
-Meu namorado não quis entrar. Todo namorado quer acompanhar o exame ginecológico da namorada.
-Deveria se orgulhar. Sinal que seu namorado respeita você.
-É um banana, doutor. É capaz de me entregar de bandeja para outro homem. Não me ama. Se me amasse sentiria ciúme. Faria um escândalo. Sou feia, doutor? Me diga, sou feia?
-Com todo respeito, você é uma mulher muito bonita. Seu corpo é perfeito. Qualquer homem se orgulharia de ter você como namorada.

Quando saiu da consulta encontrou Tavinho lendo revista . Ainda tentou provocá-lo.
-O Doutor Adalberto disse que sou uma mulher linda. Que todo homem teria orgulho de me namorar.

Tavinho não se abalou.
-Ele tem razão. Você é uma mulher linda, por isso vamos nos casar.
Liciane mordeu os lábios e se ressentiu com a suposta indiferença de Tavinho. Ela pensou que ele não era como os outros homens. Nunca fazia cena de ciúme. Sentia por ela um profundo descaso. Na festa de aniversário de Noêmia, Liciane, mais uma vez, tentou fazer ciúme em Tavinho. Dançou com todos os rapazes. Como ele não gostava de dançar, ficou conversando com Walfrido:
- Você dá muito mole. Deixa a Liciane se esfregar com outros caras.
-Se esfregar, não, dançar. E se ela não quiser ficar comigo é só terminar o namoro. É um direito dela. Está comigo porque quer.
-Vai pensando assim. Quando casar vai ser corno. Trato a Noêmia no laço, não dou folga. Se me cornear já sabe, mato!

Foram pra casa brigando.
-Você não me ama. Me deixou dançar com todos os homens da festa e não fez nada.
-Dançar não arranca pedaço. E todos na festa sabem que vamos nos casar.
-Casar? Como vou casar com um homem que não sente ciúme de mim?
-O que você quer? Que faça um escândalo? Grite? Bata em você? Não é meu estilo. Não sou de briga.

Os ataques de Liciane já o estavam deixando sem paciência. Não entendia as atitudes da mulher com quem pensava casar. Quando no Domingo, disse a Liciane que não passaria na casa dela, para ir ao Maracanã, ver a decisão do campeonato, o mundo veio abaixo.
-Domingo?! Vai me deixar sozinha?!
-Futebol é sagrado. Hoje é decisão de campeonato. Não perco por nada.
Revoltada, e se sentindo rejeitada, gritou:
-Vai me pagar, Tavinho! Quero ver se não vai sentir ciúme de mim dessa vez! Quero ver! Vou chamar a atenção de todo mundo! Vai ter que tomar uma atitude!

Tavinho não se importava com as ameaças de Liciane. Para ele, decisão de campeonato era mais importante do que os caprichos da namorada. Adorava ver o Maracanã lotado. Quando o juiz deu início à partida, entrou em êxtase . Dez minutos depois de iniciada, quando o jogo começava a esquentar, uma mulher nua invade o gramado. Tavinho reconhece logo. Era Liciane. Surpreso com a atitude desvairada da namorada foi embora do estádio, envergonhado diante da gozação dos amigos. Enquanto o estádio gritava, em coro, “Gostosa, gostosa, piranha, piranha”, Liciane era retirada do gramado por dois seguranças.

Acabou trocando o amor sem sal de Tavinho, pela fama meteórica. Contou a história de sua nudez para rádios, jornais e programas de fofoca televisivos. Além disso, posou nua para revistas masculinas e passou a cobrar cinco mil reais para permanecer meia hora nas festas de famosos.

Radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo.





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