sábado, 17 de junho de 2017

A primeira comunhão


* Por Clóvis Campêlo


Naquela época, a Primeira Comunhão não era apenas uma festa familiar. Era uma festa comunitária. Toda a vizinhança participava. Lembro da nossa casa no Pina bem cheia, repleta de amigos, parentes e vizinhos. Um frege, no bom sentido, já que naquela dia especial nem eu nem meus irmãos, Carlinhos e Mana, poderíamos prevaricar. Nem em pensamentos. E, confesso, não era fácil manter essa retidão de pensamento e comportamento. Tudo conspirava contra.

Estávamos todos vestidos de branco, simbolizando a pureza das nossas almas. O sacramento se daria à tarde, na Igreja de Nossa Senhora do Rosário, sob a batuta do Padre José, ao lado dos outros alunos do Instituto Dantas, escola que promovia o evento cristão. A festa propriamente dita seria depois, em casa, ao voltarmos da igreja. Comida e bebida, à vontade. Mas aí já estaríamos aceitos fazendo parte definitivamente da comunidade da Igreja Católica Apostólica Romana.

A Primeira Comunhão é uma celebração da Igreja Católica, onde os participantes recebem pela primeira vez o Corpo e o Sangue de Cristo em forma de pão e vinho. Para receber a Primeira Eucaristia, como também é chamada a celebração, deve o cristão saber e compreender alguns princípios e fundamentos da Igreja, como os 10 Mandamentos, os Mandamentos da Madre Igreja, suas principais orações, e os 7 sacramentos. Antes do rito religioso, o participante deve se confessar, livrando-se assim dos pecados e faltas graves cometidos.

Segundo a Wikipédia: “a Eucaristia é " o próprio sacrifício do Corpo e do Sangue do Senhor Jesus, que Ele instituiu para perpetuar o sacrifício da cruz no decorrer dos séculos até ao seu regresso, confiando assim à sua Igreja o memorial da sua Morte e Ressurreição. É o sinal da unidade, o vínculo da caridade, o banquete pascal, em que se recebe Cristo, a alma se enche de graça e nos é dado o penhor da vida eterna." (n. 271). A palavra hóstia, em latim, quer dizer vítima, que entre os hebreus, era o cordeiro, sem culpa, imolado em sacrifício a Deus”. Ou seja, exista na cerimônia toda um simbologia que deve ser entendida, pratica e respeitada pelo participante.

Não era fácil para nós, eu e meus irmãos, seguirmos tudo isso ao pé da letra. Meu pai e minha mãe não eram de frequentar a igreja e nem nos obrigavam a isso. Mas havia um misto de respeito e temor que nos fazia ir adiante sem nada questionar. Para nós, era melhor e mais seguro estar ao lado de Deus, Jesus Cristo e todos os anjos do que vagarmos indefesos e solitários sob as tentações do demônio. E além do mais, todos os nossos colegas e amigos da escola estavam ao nosso lado naquele momento e isso fazia com que nos sentissemos seguros e protegidos. Restaria-nos depois, ao longo da vida, mantermos essa chama acesa e vibrante. Intuitivamente, sabíamos que não seria nada fácil, pois são muitas as tentações e os perigos dessa vida.

A festa em casa, ao voltarmos da igreja, foi plena e vibrante. Aos poucos, porém,a casa foi esvaziando e a família ficando sozinha. Nossas roupas brancas e nossos livrinhos foram guardados e ainda hoje se encontram entre os objetos deixados por dona Tereza, minha mãe, quando faleceu.

À noite, sozinho, quando me deitei e tentei conciliar o sono, percebi que teria pela frente uma longa caminhada a percorrer, e que nessa caminhada estaria para sempre dividido entre a virtude da retidão da crença religiosa e as tentações do mundo dos homens.

* Poeta, jornalista e radialista.


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