segunda-feira, 27 de março de 2017

Carta de outono

* Por Barros Pinho

escrevo para ti que não conheço
no segredo que fere o úmido do orvalho
na linha azul onde o tempo escreve a avidez
no papel de nuvem a nuvem mais branca do céu
o céu de ninguém na existência profética dos rios
a descer sobre õ vale na terra morena de teu corpo nu
na semântica do vento na palavra de augúrio da cigana
envolta no feitiço na sedução do fruto maduro
em tua boca a flor salgada a saltar do mar
no relâmpago uma pupila de seda de teus olhos grandes
se espreita a sombra no último gosto da espera
uma lembrança de sol arde no perfume de tua pele
e pássaros tocam flauta de palha no teu ventre de fogo
a aurora acorda na reticência de rosas no púbis das estrelas
o teu olhar abre a tarde para o anúncio próximo da noite
a colina ofegante de teu corpo afaga a chuva fina em teus cabelos
enquanto a vida planta eternidade no luar de tua vagina
viajor de sonho contemplo teus pés pisando pedras no riacho raso
onde borboletas se extinguem enterneci das na volúpia
das abelhas postas em teus seios entumecidos de distância
na homilia das águas celebrando desejos o desejo
interminável das insônias onde as madrugadas se extraviam


* Político, poeta e contista, autor dos livros “Natal de barro lunar”, “Quatro figuras no céu”, “Planisfério” e “Circo encantado”, entre outros.   


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