quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Corram, a casa pode explodir!


* Por Mara Narciso


A maioria das casas tem seus botijões de gás trocados pelas distribuidoras na hora em que acabam, e o gás findado na hora do almoço (claro, o gás desligado não acaba), deixa as famílias esperando com fome. A maioria usa o botijão de 13 kg, que contém propano (chama azul, queima primeiro) e butano (chama amarela, queima por último), sendo 85% na forma líquida – por ser colocado no botijão sob pressão – e 15% na forma gasosa. Não se deve deitar o botijão, pois a forma líquida que fica na parte de baixo pode causar acidentes graves. Muitas vezes vi Milena, a minha mãe, usar álcool e fogo dentro de tampa de leite em pó sobre a trempe para terminar o almoço. Eram comuns leves vazamentos, verificados com bolhas de sabão, sendo preciso retirar a válvula e recolocá-la, pois a espiral da rosca do botijão (ou bujão) poderia estar em desacordo com a rosca da válvula do fogão. Essa providência resolvia quase todos os casos.

Quando menina, presenciei um incêndio em um depósito de gás no centro da cidade. Os botijões subiam como foguetes e eram vistos de longe. Uma vez houve um vazamento de gás na cozinha de minha mãe, durante a noite, e quando Du, a cozinheira, acionou o interruptor de luz houve uma explosão, que por pouco não a matou.

Há doze anos, numa noite de sábado, meu então marido trocava o gás, quando, ao puxar o novo botijão para o lugar, um desnível no chão fez o artefato tombar, bater na parede e romper o cano abaixo do regulador de pressão e acima da borboleta. O gás saiu em borbotões na forma líquida, como um repuxo. Estava dentro da cozinha, com vários aparelhos ligados, então, após empurrar o botijão parcialmente para a área externa, corremos ele, meu filho e eu para fora, e de lá ligamos para o Corpo de Bombeiros que orientou desligar o relógio de luz (estava inviolável e tivemos de arrombá-lo com uma faca do vizinho) e ficar na rua até o gás acabar. Depois chegaram paramentados os soldados do fogo. O botijão, que ainda vazava, foi colocado para fora da casa. Quando acabou, abrimos tudo para arejar e dissipar o gás mais rápido. O local estava irrespirável. Ligamos ventiladores, mas a casa ficou impregnada por muitas horas.  Na verdade, o gás de cozinha é inodoro, mas por ser venenoso, recebe componentes a base de enxofre para que sirva de alerta nos vazamentos.

Novembro de 2016: depois de meio dia e meia, a cozinheira precisou trocar o gás, e na troca surgiu um vazamento. Geny retirou e tentou recolocar a válvula, mas aconteceu uma súbita e imensa saída de gás, às golfadas, como uma água saindo da mangueira, o que a fez soltar um grito de pavor. Chamei a todos e saímos correndo, ela, meu filho e eu, desligando tudo e indo para fora. (Soube depois que só se deve desligar a chave geral se ela estiver do lado de fora da casa, e não se podem ligar ventiladores, durante o vazamento). Avisamos os vizinhos laterais. Alguns saíram com as crianças. Do outro lado da rua sentíamos o cheiro e ouvíamos o chiado característico.

O gás doméstico é mortal, explosivo e inflamável diante de qualquer fagulha, por isso não se deve usar nada metálico para bater e apertar a borboleta. O Corpo de Bombeiros disse que só viria caso pegasse fogo. Quando reduziu o barulho e o gás estava no fim (quase duas horas), chamamos o fornecedor que trocou o botijão, pegou o que veio com problema, cuja cor azul estava branca, coberta com uma carapaça de gelo e ensinou que, se acontecer um grande vazamento, como foi o caso, é preciso ter calma, enfiar uma chave de fendas no buraco do botijão, girar duas vezes para acionar a válvula de segurança, e parar o vazamento.

Voltamos, ventilamos a casa, esperamos o almoço, e tivemos um final feliz, porém contaminamos a atmosfera, mais uma vez. Poucos conseguirão ter sangue frio para tentar parar a saída do gás. Não será o meu caso.

*Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”   



Um comentário: