quarta-feira, 25 de maio de 2016

Muda a Voz do Brasil


* Por Mara Narciso

A importância do rádio permanece, ainda que existam meios mais modernos. É a mídia barata que chega mais depressa. Ouvir é uma grande diversão, basta ver as reações dos não ouvintes, quando, através da tecnologia, ouvem pela primeira vez. São surpresa, festa e alegria. Então, no distante Brasil, aonde a internet chega mal, ou faltam recursos, lá está o rádio, trazendo as notícias boas e más, estas numa angustiante predominância.

O tempo no rádio, por ser mais amplo, possibilita o anônimo se manifestar com liberdade, mesmo sendo clara a linha do veículo. Muitos locutores fizeram o curso de jornalismo, depois de serem reconhecidos profissionalmente, ainda que o ministro Gilmar Mendes tenha dito que não é preciso diploma, pois “a profissão não oferece perigo de dano à coletividade”. Não?

Músicas que não tocam na TV tocam no rádio. Muitas estações têm pregações católicas e evangélicas. O futebol tem espaço em algumas estações. Ensina-se de tudo, e fica clara a tendência política daquele ponto do dial. Para conhecer as variáveis e análises das notícias é preciso ler revistas, jornais, internet/blogs/redes sociais, ver TV e ouvir rádio de vários matizes. Então, será possível esboçar uma imagem sobre o que se passa, especialmente no tempo inseguro que vivemos.

Nesse contexto, era indispensável ouvir, de vez em quando, a Voz do Brasil (nos seus primórdios, Hora do Brasil), da EBC Serviços – Empresa Brasileira de Comunicação. No tempo da Ditadura Militar era um programa “chapa branca”, de exaltação ao “Governo Atual”. Quando era ouvido “O Guarani” de Carlos Gomes, e “em Brasília, 19 horas”, muitos calavam o rádio. O programa se dividia em um tempo para cada um dos três poderes: Executivo, Legislativo (Senado e Câmara Federal) e Judiciário. Desde 2007 era possível ver a pluralidade de opiniões, com espaço para os vários grupos da nação Brasil.

A primeira parte falava das ações do governo, valorizando, através de comentários de pessoas beneficiadas, os feitos do Governo Federal. Nos seus devidos tempos, senadores e deputados se manifestavam, com notícias dos vários partidos, inclusive oposição ao governo e citações de projetos de lei. O Judiciário mostrava casos em que a lei dera ganho de causa para o fraco, geralmente um empregado, que tivesse passado por constrangimento e humilhação.

Michel Temer exonerou o diretor-presidente da EBC, Ricardo Melo, cujo mandato, pela lei aprovada pelo mesmo Temer, deveria ser de quatro anos. Para seu lugar, nomeou o jornalista Laerte Rímoli, que fez a campanha de Aécio Neves, teve uma passagem pela Rede Globo (segundo a própria Voz do Brasil) e comunicação da Câmara Federal, onde nunca fez crítica a Eduardo Cunha. De acordo com a primeira diretora do órgão, a jornalista Tereza Cruvinel, houve “um rebaixamento dos canais públicos a condição de serviços de comunicação governamental”.

A mudança do Governo Dilma para o Governo Temer levou a uma alteração no tom. Não se fala mais “presidenta afastada”, mas sim “presidente”, e não é dito “presidente em exercício” sempre que Temer é mencionado. Os casos populares sumiram, e não há mais discurso da oposição. No desmonte do governo anterior, sabe-se que a coordenação da Voz do Brasil é outra.

Tereza Cruvinel diz na sua carta ao presidente interino: “O que está em causa é a inobservância da lei e a preservação de um direito difuso da  sociedade brasileira, o direito a uma comunicação pública complementar e independente, asseguradora da expressão da diversidade e da pluralidade, característica das sociedades democráticas.

Foi isso que a Câmara dos Deputados aprovou naquela noite (19/02/08), com o seu voto. Não o renegue, aniquilando a comunicação pública.”  Então, que os espaços sejam respeitados como antes, para que não seja preciso desligar o rádio quando os ponteiros marcarem 19 horas. A Voz do Brasil muda.

*Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”   



Um comentário:

  1. Concordo com muita coisa, Mara. Tenho também os dois pés atrás em relação a Michel Temer - embora entenda que qualquer Michel Temer é melhor do que o que tínhamos antes dele. Agora, não há como negar que, nas mãos do partido dos trabalhadores, a EBC e a Voz do Brasil continuaram tão "chapa branca" quanto no tempo do Brasil grande do governo militar. Uma chapa branca a serviço do embuste vermelho.

    ResponderExcluir