sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Viajante de primeira viagem


* Por Eduardo Oliveira Freire


"Fixo instantes súbitos que trazem em si a própria morte e outros nascem – fixo os instantes de metamorfose e é de terrível beleza a sua sequência e concomitância." Lispector , Clarice Água Viva.

Sou mais um na multidão ou alguém sabe meu segredo? Tento esconder minha alegria de criança por viajar ao exterior pela primeira vez. Não quero aparentar ser bobo, tem tanta gente que já está tão acostumada como se fosse à padaria ou ao supermercado. Este tipo de gente é internacional, enquanto eu...

Meu lado adulto-pretenso-informado aperta forte a mão do meu lado criança. Alguém me olha, será que fui descoberto? Será que estou um clichê? Não quero me machucar ao ficar idealizando uma viagem de um mês e expor minha felicidade clandestina, sei lá, um indivíduo mal intencionado pode manipulá-la para me dominar mentalmente.

Estou cansado de construir castelos de nada, só desejo curtir o momento sem pretensões. Quer saber de uma coisa? Saltarei no escuro! Se eu me foder, não tem problema. Vou me reerguer novamente e continuar a viver.

Está na hora do avião decolar. Será que vou morrer num ataque terrorista ou afogado pelo tsunami e se o avião cair? Que se dane! Estou viajando para o exterior, um sonho tão antigo desde que me entendo por gente. E mesmo estar num avião na classe econômica faz meu coração pulsar como nunca.

Nunca mais senti isto desde quando era menino. Devo estar com um sorriso de tolo no rosto, não vou mais me esconder. Podem achar que sou um turista de primeira viagem, cafona e ignorante, não me importarei mais.

Estou fruindo a emoção de viver minha aventura particular, que só tem valor para mim. Olho para janela do vizinho (estou no meio) está de noite e sinto um formigamento gostoso na barriga.

Estou pronto para o bem e para o mal. O importante que estou vivendo. Que venha o desconhecido!

* Formado em Ciências Sociais, especialização em Jornalismo cultural e aspirante a escritor - http://cronicas-ideias.blogspot.com.br/



Um comentário:

  1. Acabei por mergulhar em seu medo e vontade de disfarçar. Falou tão bem, Eduardo!

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