sexta-feira, 30 de outubro de 2015

O certinho


* Por Rodrigo Ramazzini


- Eu quero terminar! Não quero mais...
- Como assim?
- Como assim, Bruno Otávio? Acabou!
- Por quê?
- Nosso namoro caiu em uma rotina. Não agüento mais!
- É?
- É sim! E a culpa é tua.
- O que foi que eu fiz?
- O problema não é o que fazes, e sim, o que não fazes... É sempre tudo igual!
- Como assim?
- Ah! Sei lá, Bruno Otávio! Tua roupa mesmo: sempre de camisa preta bem passada. Tudo certinho!
- Eu gosto de preto... Tu também gostavas.
- Gostava! Falaste bem. Agora, me irrita.
- Mas é que eu achava...
- Achava nada. Os teus assuntos também... Sempre os mesmos, sempre girando em torno das mesmas coisas. Estou de saco cheio!
- Mas nós nem conversamos muito.
- Este é o problema. Quando conversarmos é sempre a mesma coisa. Sempre politicamente correto. Nem me contar uma piada com final indecente, para variar, tu fazes...
- Eu posso comprar um livro do Ari Toledo, se esse é o problema...
- Não é só isso!
- Tem mais?
- Tem! Os lugares que tu me levas... Eu quero às vezes pular de bunge jump, fazer um rapel, andar de kart, fazer uma trilha... Sei lá! Algo diferente.  E não ficar com a bunda quadrada por causa das cadeiras dos restaurantes... 
- Eu pensava...
- Nem tomar um porre nestes lugares tu tomas!
- Eu posso começar a beber, se quiseres...
- Nem para protagonizar uma história tu serves... Quando que eu tive que te carregar de um lugar destes? Nunca!
- Eu...
- Tu nada! Nada mesmo. Nem o jeito que me beijas tu mudas. É sempre do mesmo jeito! Desde que nos conhecemos é com a cabeça virada para o lado direito e só!
- Eu posso tentar trocar...
- Devia ter tentado trocar antes.
- Mas Lúcia...
- E o sexo então? Não vou nem comentar...
- O que tem o sexo?
- Ai Bruno Otávio... Na hora do sexo, eu quero ser pega com força, jogada de um lado para outro... Transar na garagem, no banheiro, na sala... Aí!
- Ah!
- Cansei de transar na cama e na mesma posição.
- Se era esse...
- Ser era esse o quê?
- Se era esse o problema... Se era assim que queria... Era só ter pedido! Ora...
- Ai, ai... Meu Deus! Ele não entende mesmo... Sabe o qual é o teu problema, Bruno Otávio?
- Ah qual?
- Não sabes?
- Não, né!
- Então eu vou te falar: tu és muito certinho! É isso... Esse é o problema!
- Mas tu preferes o que: um certinho que te ame ou um desorientado sem-vergonha?
- Eu prefiro um desorientado que me ame.
- Então! Eu te amo e não sou tão certinho que nem tu imaginas.
- Ah, não é? Então prova!
- Se eu provar, tu prometes que não termina o namoro?
- Prometo!

Bruno Otávio pega o telefone.

- Para quem estás ligando?
- Para a Sandra.
- Que Sandra?
- A sua amiga Sandra...
- O quê? Para a minha amiga Sandra?
- É... Espera... Alô Sandrinha! É o Bruninho, tudo bem? Vamos sair hoje de novo? Eu sei que pode! Naquele mesmo motel? Combinado. Às 22h. Beijão...


* Jornalista e contista gaúcho



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