quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Eu amo meus médicos, volume dois


* Por Mara Narciso


Peço que compreendam os médicos, mesmo sabendo que ser vocacionado para a medicina não é prerrogativa de todos, mas ainda assim, lutam para exercer a profissão com dignidade. Há flores e espinhos e a colheita não é garantida. Fazer defesa é corporativismo? Que seja. A minha mãe, Dra. Milena Narciso, se dedicou integralmente à ginecologia e obstetrícia por 28 anos na Santa Casa de Montes Claros. Entusiasta pela causa, grande estudiosa, na semana em que passou mal e logo nos deixou, aos 68 anos, tinha acabado de fazer um curso de atualização em gravidez de alto risco. Como teve quatro filhos, acolhia a parturiente, pois entendia a dor do parto. Suas normas morais e éticas eram inflexíveis, e sua conduta rígida em todas as instâncias.

Tive professores na graduação e na residência médica que foram humanistas em sentido amplo. Não presenciei pressa, indiferença, automatismo ou mera tecnicidade neles: Dr. João Jaques Godinho, Dr. Athos Avelino, Dr. Geraldo Mota, Dr. Hermann Alexandre Viváqua e Dr. José Diogo Martins. Na vida me aconteceu um Dr. Fábio, do qual nunca soube o sobrenome. Ele fez um rosto para mim, em Belo Horizonte, quando eu tinha um mês de vida. O Dr. José Estevam Barbosa, pediatra, me tirou de uma crise de cálcio baixo, quando eu já revirava os olhos.

Os médicos não são todos calmos e compreensivos. Alguns se mostram impacientes, e deveriam rever seus comportamentos. Trabalham em situações limite, mesmo os que estão por detrás de sofisticados aparelhos. Entre eles e a máquina há um coração que pulsa, um cérebro que pensa, uma alma que teme. Há medo do exame em si, mas, muito mais do resultado. Se por um lado acalma, por outro, a consulta é também momento de tensão e susto.

Médicos detêm o conhecimento para cuidar da vida humana, o bem mais precioso que temos. Nem sempre terão boas notícias para nos dar. Não descarto o prazer de alguns em dar más notícias, mas a maioria chora com seus pacientes, quando alguma coisa não vai bem. Diagnósticos ruins precisam ser envolvidos pelo manto da esperança e não por palavras vãs, porque costumam ser descobertos em tempo hábil, e novos medicamentos surgem a cada dia. A ameaça e o peso, sendo divididos, ficam mais amenos.

Nos meus quase 36 anos de endocrinologia, vi mudanças impressionantes, mas para continuar, preciso buscar motivação todos os dias. Vi crianças portadoras de diabetes em estado de coma, sentarem e pedirem comida em menos de 24 horas de tratamento com soros e insulina rápida. São milagres.

Eu creio na medicina, eu creio nos médicos, e também creio na indústria farmacêutica, tantas vezes considerada vilã e sabotadora dos tratamentos alternativos, complementares e baratos. Eu creio nos bons resultados da ciência, assim como acredito que a consulta médica, quando bem conduzida, tenha efeito terapêutico. Num momento de fragilidade, chegando sozinho ou levado por alguém em situações mais graves, o doente precisa ser acolhido, valorizado em suas queixas, com respeito e atenção. Na emergência o procedimento tem de ser veloz, mas não cabe velocidade numa consulta habitual.

Dr. José Quaresma, meu patologista, já teve a desagradável missão de me passar diagnósticos ruins, mas de uma maneira afável, em que, em meio ao desespero, consegue-se força para enfrentar o problema. Dr. Augusto Gonçalves, meu radiologista, é alma boa e paciente, com suas máquinas invasoras que fazem recortes no corpo humano como se fossem maçãs tratadas por uma faca amolada e nos vê parte a parte. Quando colhe biópsia, torce com a gente. Dra. Maria Isabel Rebello faz ultrassom com a delicadeza de uma lady, que ela é em todos os quadrantes. Tão educada que constrange. Dra. Consuelo Guedes Meira, minha psiquiatra, conhece a alma humana, ainda que ela, a alma, possa pregar peças até nos mais experientes. Gente é multifacetada, e em seu divã passam histórias para encher vultosas bibliotecas.

Eu amo meus médicos: Dra. Margarida Batista, anestesista, Dra. Andréa Laughton, dermatologista, Dr. Marcos Borém, otorrinolaringologista, Dra. Rita de Cássia Leite, cardiologista, Dr. Wetherman Vilela, oftalmologista, Dr. Paulo de Tarso Salermo Del Menezzi, mastologista, Dra. Fátima Lacerda, ginecologista e Dra. Samyra Lacerda Davi, proctologista. Da cabeça aos pés, vão estudando, aprendendo com os livros e com as pessoas, que são o que realmente importa. Não são de vidro, são preciosas, e para melhorar a saúde, precisam de técnica e atenção. Os que dão carinho não são apenas médicos, são anjos, coisas que os médicos do SAMU são à perfeição.

*Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”   



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