quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Paz e amor


* Por Urda Alice Klueger



(Para Eduardo Venera dos Santos Filho e para todas as centenas de milhares das vítimas da Colômbia, fora os desplazados)


Assinaram a paz da Colômbia ontem, meu amor! Como um sonho, como um presente inesperado do destino, de repente ligo a televisão e, de branco, usando guayaberas, todos estavam reunidos para assinar a paz, bem quando teu pequeno retrato de quando tinhas 25 anos me olhava candidamente, um retrato quase desconhecido, de um rapaz usando brilhantina, assim como não te conheci. Quando apareceste em minha vida a brilhantina já se fora e teus leves cabelos de luz se sacudiam e voavam ao vento de forma tão arrebatadora que ainda me sinto voando neles! Não sabíamos, naquela altura, que havia uma Colômbia em guerra – tão pouco sabíamos da vida além do amor!

Então ontem assinaram a paz da Colômbia, lá em Havana, bem naquele lugar onde eu estivera faz três semanas, junto aos irmãos que apostaram tudo, inclusive a vida, para que houvesse paz um dia. E eu perguntava a um dos companheiros sobre o que ele achava, e ele me dizia que os Estados Unidos precisavam acabar com a guerra de forma barata, pois já havia apostado todos os milhões de dólares possíveis no assassino Uribe, que se limitou a assassinar indiscriminadamente na tentativa de pôr fim à guerra, sem obter nenhum resultado. Insistia com o companheiro: “Mas há na História algum caso semelhante, em que o perdão imperou para se terminar uma guerra assim?” – e o companheiro me falava da Guerra Civil Espanhola e não me convencia, pois tanto quanto conheço, ninguém perdoou ninguém, ainda, na Guerra Civil Espanhola.

Mas ontem, assinaram a paz, e eu estava tomada de tal alegria, de tal euforia por aquele país onde, quando se estuda sua História, fica-se pasmo que ainda tenha sobrado alguém vivo, aquela Colômbia que sangrou abundantemente e absurdamente nos últimos 66 anos, que tinha que dividir aquela alegria com alguém! Quis o destino que a primeira pessoa com quem pude repartir minha alegria fosse uma das pequenas libélulas lá do Passado, coisas que não se explicam.

E depois que terminou a cerimônia eu fiquei olhando para aquele teu retrato com brilhantina e pensando num dia em que chegaste até mim com os braços abertos de alegria anunciando a tão esperada nova:

- Acabou a guerra do Vietnã! – e me prendeste no refúgio junto ao teu peito, onde eu nada temia. Nas semanas e meses seguintes soubemos que a guerra do Vietnã ainda não havia terminado de verdade.

Então fiquei pensando naqueles tempos de 1973 e nos seis meses para ajustes que foram acordados ontem na assinatura da paz na Colômbia.

Céus, é muita coisa para acabar de verdade com uma assinatura lá na paradisíaca Havana. Como, agora, desmobilizar os paramilitares, só para começar? Eles estão armados, e muito bem armados – o que vai acontecer ainda até que a sofrida gente da Colômbia possa ter a sua paz?

Quiçá tudo corra como se sonha!!!

Blumenau, 24 de Setembro de 2014.

* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR, autora de mais três dezenas de livros, entre os quais os romances “Verde Vale” (dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12 edições).


Um comentário:

  1. Acordos de paz que se concretizam são um alento para todos. Parece que estamos distantes, mas estamos dentro dele.

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