segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Quem ri por último...


Hoje, por puro acaso, topei com um artigo que publiquei, no dia 23 de maio de 1994, na coluna “Fera”, do Caderno de Esportes do “Correio Popular” de Campinas, onde era editor (e não apenas de uma única editoria). Esse espaço havia sido criado trinta dias antes da Copa do Mundo dos Estados Unidos, como uma espécie de preparação, de “aquecimento” para a cobertura daquele Mundial, que o jornal prometia que seria completa e original (e foi), a despeito do pessimismo que cercava a Seleção Brasileira, que havia se classificado para a competição na chamada “bacia das almas”. Por pouco não ficou de fora. Ademais, fazia 24 anos da conquista do tri, no México. Foi um ato de ousadia do Correio Popular.

Confesso que não me lembrava que havia digitado esse artigo e arquivado em meu bagunçado e volumoso arquivo eletrônico. E por que trago à baila, neste espaço nobre voltado à Literatura, esse tema que, aparentemente, nada tem de literário? Por dois motivos principais. O primeiro é para lembrar os leitores (e, sobretudo, as editoras) que sou autor de um livro (ainda inédito) sobre sucessos e fracassos da Seleção Brasileira, intitulado “Copas ganhas e perdidas”, atualizado com o “fiasco” do nosso futebol (o segundo em casa) na desastrosa campanha de 2014, que culminou com os “inesquecíveis”  7 a 1 sofridos diante da Alemanha (sobretudo) e com os subsequentes 3 a 0 diante da Holanda. Quem sabe alguém se interesse em bancar essa obra, antes ou durante o Mundial de 2018 na Rússia?! O importante é que ela existe e está madura, prontinha para ser publicada;

E qual é o segundo motivo para tocar nesse assunto? É o de enfatizar o quanto uma intuição é valiosa (quando se confirma, lógico, pois muitas vezes, desde que exposta publicamente, ela nos induz somente ao absoluto ridículo se não der certo) . O título do tal artigo, que localizei, hoje, por puro acaso, é “Já comprei minha camisa”. Com semanas de antecedência do início do Mundial, previ a conquista do tetra, assim na bucha, sem manifestar a mais remota dúvida e sem vacilar. O jornal criou, como havia prometido, um “Caderno da Copa”, com o máximo de informações sobre a competição e fui convidado para comentar a performance da Seleção Brasileira. Aceitei, claro.

Destaco que depois da publicação do tal artigo, os leitores não me deram sossego. Tanto eles, quanto os colegas de redação. Tentaram ridicularizar-me de todas as formas, desde as sutis às mais escrachadas (e inúmeras mal-educadas) e tive que ter muita paciência para administrar as “piadinhas infames” que me eram endereçadas, por cartas (os e-mails, então, nem existiam) e, principalmente, por telefone. Foi um inferno!!! Pude comprovar o quanto o complexo de viralata está entranhado na psique do brasileiro. Mas... quem, afinal, riu por último? Claro que foi este jornalista que nunca temeu correr riscos!!!

Para que o leitor avalie meu “atrevimento”, que resultou, finda a Copa, em aumento do meu prestígio junto à direção do jornal – em vez do descrédito que as “cassandras de mau agouro” previam, para mim e para os comandados de Carlos Alberto Parreira –  reproduzo, na íntegra, o citado artigo que comprova, inclusive, o surrado clichê que diz que “quem ri por último ri melhor”. No caso, eu (e os raros brasileiros que acreditaram na Seleção) rimos com a maior satisfação. Adoro uma polêmica!!! Leiam o que escrevi naquele distante 23 de maio de 1994, véspera do embarque da nossa equipe para os Estados Unidos:  

“A seleção brasileira, convocada a semana passada, e que embarca rumo aos Estados Unidos amanhã, vai estrear na Copa do Mundo com 80% da capacidade física dos jogadores, conforme previsão do fisicultor Moracy Sant'Anna. Isso é bom? É mau? O tempo para a preparação, praticamente de menos de um mês, é curto, como se propala? Acredito que não!

Até porque a sua base é a mesma do grupo de 1990, que fez aquele fiasco, que todos nós lembramos, na Itália. Ocorre que hoje esses jogadores estão mais amadurecidos, mais experientes, mais tarimbados e mais conscientes da importância da conquista do tetracampeonato, não apenas para a satisfação dos 150 milhões de brasileiros, mas principalmente para o fecho de suas carreiras.

Posso dizer que vi, em uma oportunidade ou outra, a apresentação das 24 seleções que vão disputar a Copa e não despontou entre elas nenhum "bicho-papão". Pelo contrário, a grande maioria adota a mesma tática, o mesmo futebol-força, com congestionamento do meio de campo, no máximo dois atacantes natos e apoio dos laterais e miolo de zaga, como fator surpresa. Ou seja, a mesma forma com que o Brasil joga.

A diferença está no talento de um Romário, de um Bebeto, de um Zinho e de um Leonardo, coisa que os nossos adversários não têm.

Ninguém, evidentemente, pode prever quem irá conquistar a Copa. Se isso fosse possível nem haveria disputa. A graça desse esporte e o motivo de ele empolgar multidões é exatamente a sua imprevisibilidade. Nem sempre o melhor é o campeão. Prova disso foi o último Mundial, o da Itália, em que a Alemanha teve uma apresentação discretíssima e emplacou seu tricampeonato sem nenhum brilho. Aliás, na fase de classificação, chegou a ser decepcionante, colhendo magros resultados que lhe permitiram apenas se arrastar até a final.

Apesar de tudo isso, por uma questão, digamos, de sexto sentido, de intuição, fiz uma coisa inédita enquanto torcedor doente da Seleção. E olhem que esta será a 12ª Copa do Mundo da minha vida. Comprei uma camisa canarinho, de número dez --- de Pelé, para dar mais sorte --- na certeza de que desta vez irei, finalmente, soltar o grito que ficou preso na garganta em 1982, por causa do "verdugo de Sarriá", o italiano Paolo Rossi. Aquele time, apesar de haver ficado marcado pelos fatídicos 3 a 2 para a Itália, foi empolgante, espetacular, mágico.

Vejo, todavia, uma determinação maior no atual grupo, que em momento algum, mesmo nos heróicos 6 a 0 contra a Bolívia, no Recife, durante as Eliminatórias, contou com a confiança do torcedor. Além disso, nossos adversários, convenhamos, não são bichos-papões.

A Rússia está às voltas com briguinhas de comadres, e muitos dos seus principais astros não foram convocados. Camarões, apesar da autoconfiança (excessiva) de seus jogadores, é uma seleção envelhecida em quatro anos (a base é a mesma de 1990) e sequer foi a campeã da Copa da África. A Suécia é aquilo que conhecemos. Provavelmente foi o selecionado que o Brasil enfrentou mais vezes em mundiais.

Daí não ser preocupante o fato de a nossa equipe estrear com apenas 80% da sua capacidade física. O auge será, e deve ser, atingido na grande final, quando poderemos soltar o grito preso na garganta há sofridos 24 anos: é tetracampeão, é tetracampeão!!”

Boa leitura.

O Editor.

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Um comentário:

  1. Coragem monstra. Nem a mãe do técnico ousaria tanto. Estamos precisando. Na lavada que levamos, fui covarde. Só vi até o terceiro gol. Desliguei e fiquei a ouvir os gritos, sem acreditar.

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