domingo, 24 de maio de 2015

Espelho das horas


* Por Pablo Uchoa


O relógio de mesa
Prostrado sobre a cabeceira da cômoda
me incomodava

- Você devia trocar as pilhas do seu relógio -
Ela me alertou certa vez:
- Para que serve relógio sem pilha?
E fez o sinal da cruz

Lancei-lhe um olhar piedoso:
Ele - murcho
Esquecido no desbotar da inércia e do corriqueiro quarto
a poeira das prateleiras a ponto de adormecer-se sobre ele

Finge vencer o tempo, mas os ponteiros cabisbaixos
imóveis entre o 2 e o 3, o 10 e o 11
(o tempo parou às 2h53)
acusam a debilidade franzina do tique-taque ausente

Tempo contado sem encanto nem viço
Retrato fiel do passa-horas estanque da minha vida

(*) Cronista e editor do site www.narizdecera.jor.br. Vive atualmente na Inglaterra, dedicando-se a pesquisas no Institute for the Studies of the Americas, da Universidade de Londres. Autor do livro-reportagem “Venezuela: A Encruzilhada de Hugo Chávez” (Ed. Globo, 2003), menção honrosa no prêmio Vladimir Herzog 2004.

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