sábado, 28 de fevereiro de 2015

Conversando com minha mãe 5 – Pri


* Por Urda Alice Klueger


(Para Rogério Gil Theodorovicz e a Pri)


Sabe, mãe? Taí outra coisa que não tenho com quem conversar. Naquela altura minha vida estava dividida entre o pessoal do trabalho, os estudantes de História e a mãe. Não havia tempo para falar com mais gente, e então eu fui contando tudo para a mãe.

O primeiro colega que eu conheci no primeiro dia do curso de História foi o Rogério. Acho até que já o encontrei no Vestibular. Sei que ele esteve sempre junto, sempre por perto, como acho que ainda hoje está, embora agora a gente se encontre mais nas redes sociais. Mas era um amigão, bom para fazer trabalhos em equipe juntos, estudioso, curioso, acabou indo pesquisar o seu povo, que eram os descendentes de ucranianos da região de Canoinhas, isto já na especialização.

Quando Rogério chegou ao curso de História, nos seus parcos 21 anos de vida, já chegou com muitas dificuldades: perdera o pai pouco antes, e sua mãe lutava pelo pão do dia a dia lá na sua Canoinhas, tocando um pequeno comércio. Mas ele era cheio de vida e de otimismo, e com entusiasmo contava das suas pequenas aventuras na terra dele e num tempo em que vivera em Curitiba, e tais aventuras ficavam grandes, magníficas, na voz entusiasmada dele, e nunca que ele se queixava da vida. Bem no comecinho, já na primeira semana de aula, ele nos contou da sua grande preocupação: Vanusa, a namorada que ficara para trás, na sua terra, tendo dentro dela um bebezinho que eles tinham feito, e todos nós nos tornamos mais ou menos padrinhos e madrinhas daquela criancinha que ainda não havia nascido.

Priscila foi o nosso primeiro bebê no curso de História, e dia a dia eu contava para a mãe as novidades: das dificuldades que o Rogério, sua mulher e a Pri enfrentavam para ficarem juntos aqui em Blumenau, afinal, e de como aquela pequenina família batalhava pelo direito à felicidade e à vida, e lembro como a mãe se admirava a cada coisa que eu contava, orgulhosa que era dos meus valorosos jovens companheiros historiadores:
- Isto é que é um rapaz de valor! Fosse outro, talvez esquecesse que deixara uma filhinha para trás!

Ao longo daqueles anos, Rogério, eu e a mãe acabávamos nos encontrando, e o Rogério contava coisas assim:
- Sábados à tarde eu tiro para brincar com a minha filha!

Curiosa, a mãe queria saber mais:
- E de que brincam?
- Do que a Pri quiser. De boneca, de casinha, de qualquer coisa...

Íamos embora e a mãe reafirmava:
- Rapaz de valor!

O tempo passou, muitas coisas aconteceram, Pri ganhou a irmãzinha Maria Luisa, e sabe a mãe o que houve recentemente, agorinha, neste começo de ano? A Pri passou no vestibular da Universidade Federal de Santa Catarina, e está indo embora para Florianópolis, estudar Odontologia!

Outra pessoa não iria entender o meu entusiasmo e a minha alegria por saber que a menininha do Rogério já chegou ao vestibular e foi lá e deu um show, e então achei que deveria contar tal coisa para a mãe.

Pri, parabéns, parabéns, parabéns! Tenho certeza que, lá do outro lado, minha mãe está feliz por tua causa, também!

Blumenau, 14 de Fevereiro de 2015.

* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR, autora de mais três dezenas de livros, entre os quais os romances “Verde Vale” (dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12 edições).



Um comentário:

  1. O simples, o quase banal ganha uma vestimenta de acontecimento raro nas suas palavras. O mundo visto pela sua ótica fica um doce.

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