domingo, 28 de setembro de 2014

As muitas razões para votar em Dilma

* Por Leonardo Boff

Reconhecendo os percalços e erros que houve nos últimos 12 anos do governo de Lula-Dilma e vendo os esboços de projetos políticos apresentados pelos partidos de oposição, estou convencido de que o projeto liderado pelo PT com Dilma é ainda o mais adequado para o Brasil. Só por isso já meu voto vai para Dilma Rousseff.

Mas tenho outras razões a serem ponderadas.

A primeira delas: trata-se de algo de magnitude histórica inegável. A partir de 2002, com Lula e seus aliados ligados às bases da sociedade, fez-se, pela primeira vez, uma revolução democrática e pacífica no Brasil. Importa dizer claramente: o que ocorreu não foi apenas uma alternância de poder, mas a alternância de classe social. As classes dominantes que ao longo de toda a história ocuparam o Estado, garantindo mais seus privilégios  do que os direitos de todos, foram apeadas do Estado e de seus aparelhos.  Um representante das classes subalternas, Lula, chegou a ser presidente.  E realizou uma verdadeira revolução no sentido que Caio Prado Jr. deu em seu clássico A revolução brasileira  (1996): revolução significa “transformações capazes de atender as aspirações das grandes maiorias que nunca foram atendidas devidamente; revolução que leva a vida do país por um novo rumo”.

Não podemos negar que milhões viram suas aspirações atendidas e  que hoje o rumo do Brasil é outro. Pode não ser do agrado das classes dominantes, que foram derrotadas pelo voto. De um Estado neoliberal e privatista, que se alinhava ao neoliberalismo dominante, passamos a um Estado republicano, Estado que coloca a "res publica", a coisa pública, o social no foco de sua ação, Daí a centralidade que o governo Lula-Dilma deu aos milhões que estavam secularmente à margem e que foram – são 36 milhões – inseridos na sociedade organizada.

Os que antes comiam caviar têm que se acostumar a comer carne de sol  ou baião de dois
Esta conquista histórica, não podemos perdê-la. Há que consolidá-la e aprofundá-la. Os que antes comiam caviar têm que se acostumar a comer carne de sol  ou baião de dois.

Para consolidar esta revolução é que voto em Dilma.

A segunda razão consiste em garantir as duas revoluções que ocorreram: uma rumorosa e outra silenciosa. A rumorosa foram as muitas políticas sociais que são do conhecimento geral. Estas ficaram visíveis nas multidões que começaram a usufruir daqueles benefícios mínimos de uma sociedade moderna. Tal fato correu mundo e serviu de ponto de referência para outros países. Mas houve também uma revolução silenciosa: as várias universidades federais criadas em todo o pais e as dezenas de escolas técnicas e cursos professionalizantes que habilitaram  milhões de pessoas. Essa política de educação deve ainda ser estendida, multiplicada, e ganhar qualidade. Por esta razão meu voto vai para Dilma.

Uma terceira razão é o crescimento com a multiplicação de empregos. É verdade que o nosso crescimento é pequeno, mas nunca se manteve o desemprego a níveis tão baixos, 5% dos trabalhadores. No mundo, dada a crise neoliberal, existem na zona do euro 102 milhões de desempregados e com nenhum ou com irrisório crescimento. Nossa geração viu cair dois muros, o de Berlim em 1989 e o de Wall Street em 2008. Resistimos às duas quedas: não perdemos os ideais do socialismo democrático nem tivemos que desempregar e renunciar às políticas públicas. Os salários nesses 12 anos subiram 70% acima da inflação. Por isso minha preferência é por Dilma.

Um quarta razão: em alguns estratos do PT houve corrupção. Esta não vem de agora mas de muito antes. Há que reconhecê-la, rejeitá-la e condená-la. Mas jamais, em nenhum momento, se acusou a presidenta Dilma de corrupta. Nem nunca ela aceitou aprovar projetos que fossem danosos ao povo brasileiro. Sempre foi fiel ao povo, point d’honneur de sua gestão.

Lutaremos para vencer. Não para vencer simplesmente. Mas para consolidar o que já se ganhou, avançar e aprofundar em muitos pontos, especilamente, naqueles que foram gritados nas ruas em junho de 2013. Resumindo, aí se pedia: queremos uma democracia participativa, na qual os movimentos sociais possam ajudar a discutir, pensar e decidir os melhores caminhos, especialmente para os mais vulneráveis. Isso implica melhor educação, mais saúde,  transporte decente, saneamento,  cultura, onde o povo possa mostrar o que sabe e participar do que se faz nas várias regiões do Brasil.

Temos que avançar na redução da desigualdade, na sustentabilidade ambiental, na reforma agrária, no proteção das terras indígenas e na cultura generalizada. Pela cultura se supera a mentalidade meramente consumista e materialista e se cria o espaço para aquilo que só o ser humano pode realizar: criatividade nas artes, na música, no teatro, no cinema, nas letras e em outros campos em que a cultura se expressa. Na cultura se revela mais claramente a alma de um povo. Estou seguro de que Dilma acatará esses pontos. Para que isso aconteça com mais segurança voto em Dilma.

Estamos assistindo ao alvorecer de  uma nova civilização biocentrada, à qual devem servir a economia, a política e a cultura. O Brasil tem todas as condições de ser um dos primeiros a inaugurar esta nova fase da história. Com Dilma será mais fácil  percorrer esse caminho. Por isso voto em Dilma.

* Leonardo Boff é teólogo e autor de “Tempo de Transcendência: o ser humano como projeto infinito”, “Cuidar da Terra-Proteger a vida” (Record, 2010) e “A oração de São Francisco”, Vozes (2009 e 2010), entre outros tantos livros de sucesso. Escreveu, com Mark Hathway, “The Tao of Liberation exploring the ecology on transformation”, “Fundamentalismo, terrorismo, religião e paz” (Vozes, 2009). Foi observador na COP-16, realizada recentemente em Cancun, no México.

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