quarta-feira, 23 de julho de 2014

Beira da catástrofe

A depredação e poluição do Planeta, que atingiu o seu auge, ou está prestes a atingi-lo nesta geração, não começou com ela. É um processo que vem de longuíssima data, desde o princípio do que entendemos por “civilização”. É certo que passou a se acelerar em meados do século XVIII, com a tal da Revolução Industrial e, a partir de então, jamais deu  trégua. Nunca se desacelerou, pelo contrário, teve aceleração em progressão geométrica, de década para década e, recentemente, de mês paras mês e quiçá já de dia para dia.

Era lógico que isso acontecesse, até por causa da multiplicação da população mundial. Esta levou dezenas de milênios para atingir o primeiro bilhão. Todavia, para chegar ao sétimo... bastaram cinqüenta anos ou menos, apesar das guerras, sobretudo das duas mundiais, que redundaram, somadas, em pelo menos 50 milhões de mortes. Mais pessoas, claro, resultam em mais consumo, em mais utilização de matérias-primas não renováveis (petróleo, carvão etc.etc.etc.) e... mais poluição. Não é preciso ser nenhum especialista para chegar a essa óbvia conclusão. É puríssima questão de lógica, daquela tão evidente que pode ser classificada, sem exagero, de “acaciana”.

O sociólogo e ambientalista norte-americano Alan Durning informou, em ensaio que publicou, se não me falha a memória nos primeiros meses de 2000: “No início dos anos 90, os americanos médios consumiam, direta ou indiretamente, 52 quilos de materiais básicos por dia: 18 quilos de petróleo e carvão, 13 de outros minerais, 12 de produtos agrícolas e 9 de produtos florestais. O consumo diário nesses níveis traduz-se em impactos globais que se equiparam às forças da natureza. Em 1990, as minas que exploram a crosta terrestre para suprir a classe consumista moveram mais terra e rocha do que todos os rios do mundo juntos. A indústria química produziu milhões de toneladas de substâncias sintéticas, mais de 70 mil variedades, muitas das quais mostraram-se impossíveis de serem isoladas do ambiente natural. Os cientistas que estudam a neve da Antártida, os peixes de mares profundos e as águas subterrâneas encontraram resíduos químicos feitos pelo homem”.

Essas cifras, hoje, sem a menor sombra de dúvida, são muito maiores. Para atualizá-las, devemos acrescentar, sem exagero, 50% de aumento. E isso se quisermos ser conservadores. Não é de se estranhar, pois, que o aquecimento global esteja se acelerando e, talvez, já seja irreversível. Para o bem da humanidade, e não apenas para nós e nossa geração, mas para nossa descendência, tomara que ainda haja alguma possibilidade de reversão. Mas, se houver e para que ocorra, nosso padrão de consumo, de desperdício e de depredação do meio ambiente tem que mudar já e radicalmente. Nada, no entanto, indica que isso vá acontecer. A conseqüência, lógica, nem precisa ser explicitada: é a pior possível. E vai além, muito além da mais delirante e catastrofista imaginação.

O editor-chefe da revista “Skeptik”, Michael Shermer, em entrevista publicada no suplemento “Mais!” do jornal “Folha de S. Paulo” em 14 de setembro de 2001, alertou:. “Se queremos entender e salvar nosso ambiente, precisamos entender que todos os humanos destroem seu ambiente. As evidências hoje mais contundentes são de que todas as megaextinções que aconteceram nos últimos 50 mil anos foram causadas ou disparadas por humanos. Na invasão da América do Norte pelos nativos americanos, havia pelo menos uma dúzia de grupos de mamíferos que foram caçados até a extinção. Você pode detectar isso na Papua-Nova Guiné, na Nova Zelândia e na Austrália também. O perigo é pensar que alguns grupos vivem em harmonia e que talvez, se adotássemos seu estilo de vida, estaríamos melhor. Todos os humanos são egoístas e inconseqüentes. Precisamos estar atentos e cautelosos sobre as conseqüências de nossas ações”. Mas não estamos.

Esse alerta foi feito há treze anos, quando os efeitos do aquecimento global já se manifestavam, posto que com muito menor intensidade e velocidade. De lá para cá, o que foi feito para racionalizar o consumo, deter o desperdício e, sobretudo, conter as agressões e depredações à natureza? Nada! Rigorosamente nada! Perdeu-se, praticamente, uma década e meia que, mesmo que aproveitada, esse aproveitamento já seria tardio. E a omissão não pode e não deve ser atribuída à falta de advertências pelos que entendem do assunto e que cansaram de tentar alertar as autoridades mundiais para o que estava acontecendo. Em vão!

Querem um exemplo? No início da década de 50 do século XX, o eminente físico russo Lew Kowarski, um dos sábios cujos trabalhos com Joliot-Curie abriram caminho para a “era nuclear” e que faleceu em 1979, alertou, em um artigo em uma determinada revista científica: “Não quero ser profeta. Mas uma coisa é certa: no ritmo atual, as reservas de combustíveis naturais, carvão, petróleo, gás, se esgotarão rapidamente, tal a industrialização dos países subdesenvolvidos, a necessidade cada vez maior dos países industrializados e o crescimento da população mundial. Alfred Sauvy diz que no ano 2000 a Terra terá seis bilhões de habitantes. E tudo isso é consumo”.

E olhem que seu enfoque concentrou-se nas reservas de combustíveis fósseis, sem os quais o mundo atual tende a parar. Mas não deixou de mencionar a questão da poluição e suas catastróficas conseqüências ditadas pelo aquecimento global causado pela excessiva emissão de gases, notadamente do dióxido de carbono. Afirmou, a respeito: “Até mesmo as medidas ecológicas preventivas consomem energia. A limitação das emissões nocivas de gás  nos carros americanos teve como resultado o aumento do consumo de gasolina. Sem falar da poluição. Los Angeles é uma cidade morta, do ponto de vista atmosférico. Quando ali se instalou a indústria cinematográfica, o céu era sempre claro, ótimo para fotografia. Hoje é o reino do smog. E o mesmo está sucedendo com as outras cidades americanas. Caso se pretenda cobrir todas as necessidades futuras de energia com os combustíveis naturais, a poluição se tornará insuportável. Já há certa inquietação com a possível diminuição do teor de oxigênio da atmosfera”.

Essas advertências foram feitas há praticamente sete décadas, espaço de uma geração inteira. Quem lhe deu ouvidos? Ninguém! O “lobby” das petrolíferas impediu o desenvolvimento de pesquisas no sentido de se estabelecer nova matriz energética, pelo menos não tão poluente ou, quem sabe, nem um pouco poluente. Nesses setenta anos, a atmosfera terrestre não parou, um único dia, um reles minuto, de ser agredida por toneladas e toneladas de gases nocivos, ameaçadores à vida, e não somente a humana. A natureza, que agora reage de forma ameaçadora, foi, convenhamos, sumamente benigna com o homem, dando-lhe oportunidades imensas de cair em  si e parar de agredi-la e de emporcalhá-la. Em vão! Como ser minimamente otimista face esta realidade sombria, literalmente à beira da catástrofe?     

Boa leitura.


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