quinta-feira, 24 de abril de 2014

Faça um favor a seus filhos e não os tenha

* Por Fernando Yanmar Narciso

Pelo que vivem me contando, creio que meus, nossos pais costumavam ser criados tal qual frangos no terreiro. Desde que dessem a eles comida e educação, pouco se importavam com as confusões que viessem a arrumar. Assim que fez quinze anos, o pai de minha primeira- e última- namorada abriu a porta de casa, apontou o dedo e disse “Não tenho mais obrigação de te sustentar. Vá tomar seu rumo!” Não tenho notícias dela há anos... Há alguns anos, um amigo da internet me falou, e isso é sério, que gostaria que seu filho tivesse nascido paralítico e abobado, pois assim ele não precisaria se preocupar em criá-lo e cuidar dele, bastando só dar um banho de esponja de vez em quando. Ora, nesse caso, ele devia ter comprado um bicho empalhado ao invés de transar sem camisinha!

O mundo, tal como tem sido estruturado ultimamente, é quase como se fosse a campanha mais efetiva de esterilização em massa de todos os tempos. Por que minha geração precisou ter uma infância tão boa? Chamem de nostalgia ou do que quiserem, mas as crianças da minha geração aparentavam ser mais valorizadas. As opções eram infinitas para mim, meus primos e amigos em meados da década de 1980 e início da década de 90: Brinquedos, jogos de tabuleiro, videogames, brincadeiras de calçada, revistas, livros e gibis, música, TV, gulodices... Enfim, o mundo era um lugar perfeito para nós.

Mas por qual motivo os adultos nos deram tantas coisas boas? Talvez a aposta no futuro. Alguns pais acreditavam, ou ainda acreditam que, quando eles deixarem de caminhar sobre a Terra, seus herdeiros assumirão o controle dessa pelota gigante feita de cera de ouvido e farão um trabalho melhor que o da geração deles. E, só pra variar, minha geração pôs tudo a perder... Basta ver o naipe dos pirralhos que pusemos no mundo depois de nossos pais. Acredito na estranha teoria comportamental de que, seja qual for a forma dos pais educarem e criarem os filhos, eles crescerão para ser o extremo oposto deles.

Quer dizer, se seu pai foi um alcoólatra e sua mãe o chifrava dentro de casa enquanto você estava assistindo Castelo Rá-Tim-Bum e brincando com os bonequinhos falsificados dos Power Rangers, seu destino é tornar-se o cidadão exemplar da casa. Por outro lado, se eles foram pessoas íntegras, honestas, amorosas e sempre te deram tudo do bom e do melhor, é provável que você ainda esteja vivendo na casa deles depois dos 25. É necessário encontrar um meio-termo entre a rigidez e a passividade e tentar impedir que os filhos tornem-se encostados ou delinquentes.

O problema é: Qual pai hoje tem tempo ou saco pra pensar nessas coisas? Numa sociedade onde são raríssimos os filhos que não foram concebidos de propósito, ninguém sabe como criá-los. Não é como nas novelas, onde um casal irresponsável recebe a visita inesperada da cegonha e a presença do nenê é a varinha mágica que proporciona o amadurecimento do casal. Aqui no mundo real, a maternidade é um saco, que só faz subtrair a liberdade dos parceiros e multiplicar a dor de cabeça. Às vezes até nos perguntamos como nossos pais conseguiram nos aguentar por tantos anos...

Não me levem a mal, mas minha geração foi talvez o maior display de maus exemplos que já se teve notícia. É especialmente difícil para aqueles que cresceram ouvindo Nirvana e Raimundos na adolescência exercer qualquer tipo de autoridade dentro de casa, afinal é meio que uma traição de seus ideais anti-establishment tentar ensinar regras de conduta aos pixotes. Como uma geração que provavelmente queimou todo o fumo da Jamaica e esvaziou os alambiques de Pirassununga teria moral pra dizer aos filhos a não seguir o mesmo caminho?

Com essa vida infernal que levamos, com todo o stress e as neuras do dia-a-dia, os pais modernos acabaram aprendendo a terceirizar a tarefa de criar os filhos. Se no nosso tempo as babás davam conta do recado, agora elas são apenas uma das encarregadas do serviço que devia ser dos pais. Psicólogas, avós, professores e diretores de escola são meio que forçados a fazer o trabalho de educar e criar, que os “donos” da criança não conseguem ou se recusam a fazer.

E o pior é que não aparece ninguém para aliviar a barra dos catarrentinhos... Atualmente não existem mais programas infantis na TV aberta, pois é proibido anunciar produtos que qualquer espécie para crianças, pois os chatos no poder creem que comerciais de brinquedos e “comida” são má influência para eles. E é uma questão de tempo para essa besteira também contamine a TV por assinatura: Atualmente tramita na câmara um projeto de censura da publicidade nos canais infantis. Quem assiste, por exemplo, ao Cartoon Network sabe que aproximadamente 4/5 da programação de canal são comerciais, logo se tal lei viesse a furo o rendimento de tais canais sofreria quedas violentas e eles acabariam tendo de encerrar atividades no país. Não dá vontade de se agarrar no Pimpão de pelúcia?

*Designer e escritor. Contatos:

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Um comentário:

  1. Muitas coisas ficaram melhores, outras pioraram, como a segurança por exemplo. Não acho que as pessoas arrumem filhos contra a vontade. E outra, o ursinho Pimpão era uma gracinha.

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