quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Inteligência e coração

* Por Pedro J. Bondaczuk

O escritor russo, Máximo Gorky, afirmou, certa ocasião, que “a ciência é a inteligência do mundo; a arte, o seu coração”. De fato, ambas atividades refletem, antes e acima de tudo, o poder de criatividade do homem, além de seu insaciável desejo de conhecimentos.

As duas disciplinas, se atentarmos bem, se relacionam e se entrelaçam. Ou melhor, se complementam. São como irmãs siamesas que convivem num mesmo corpo, posto que com cabeças diferentes. A ciência tem muito de emoção, de sonho e de fantasia, a despeito da precisão de seus métodos.

O físico Albert Einstein assegurou, com a autoridade de eminente e reconhecido cientista que foi, que toda conquista científica começa, invariavelmente, com a imaginação, o sonho e a fantasia. Estes, todavia, são testados ao extremo em laboratórios, e com o máximo rigor, até que o pesquisador se convença da sua realidade. Para isso, no entanto, tem que “descobrir”, e expor, as inflexíveis leis que regem os fenômenos estudados.

Todavia, para se tornar verdade científica, só isso não basta. É indispensável que o cientista reproduza o que quer demonstrar que é verdadeiro dez, vinte, mil, quantas vezes forem necessárias, para que seja tido como real para a ciência.

As artes têm caminhos inversos. O artista, via de regra, parte do concreto, do palpável, do real, do verdadeiro para desembocar no sonho, no virtual e na fantasia. Seu instrumento predileto (diria indispensável) é a verossimilhança. Ou seja, fazer com que o fruto da sua imaginação se “pareça” com a realidade, mesmo que não integralmente.

O escritor, por exemplo, quando escreve alguma história de ficção científica, procura jamais contrariar leis e princípios da física, da química, da biologia etc. Ou seja, tenta tornar os personagens, cenários, diálogos e circunstâncias os mais verossímeis possíveis, mesmo em se tratando de notórias e delirantes fantasias.

Guardadas as devidas proporções, as demais artes seguem a mesma trilha. Como as ciências, têm, igualmente, suas leis, suas técnicas, seus procedimentos, seus testes, suas verificações etc.etc.etc. Assemelham-se, pois, na forma e na substância.

Não vejo conflito algum entre ciência e arte. Vejo complementaridade. O cientista enxerga o mundo como ele é, tendo como ponto de partida como o imagina. A arte, por seu turno, enxerga-o como poderia ser, partindo de como ele, de fato, é. Nada impede, portanto, que um cientista competente e rigoroso seja, simultaneamente, um artista talentoso e criativo e vice-versa. Aliás, o ideal seria que todas as pessoas fossem um pouquinho de ambos.

As duas atividades geram, sempre, conseqüências práticas. A ciência desemboca na tecnologia, que, por seu turno, viabiliza as descobertas feitas em laboratório, facilitando a vida das pessoas. A arte induz seus destinatários à reflexão, à meditação, às verdades fundamentais do que e quem são, onde estão e quais são seus objetivos e metas. Não se trata, pois, de nenhuma inutilidade, como alguns desavisados (ou néscios?) são tentados a achar.

O que seria do mundo sem a ciência? O homem ainda estaria habitando em cavernas (caso a espécie não desaparecesse), vivendo da caça e da coleta de alimentos, exposto às mais banais doenças, como ser semi-selvagem, aterrorizado por fenômenos naturais que atribuiria a “deuses” existentes apenas em sua primitivíssima imaginação. Não saberia, sequer, como produzir fogo (técnica que pode ser considerada como “científica”, sem dúvida). Não teria inventado a roda, não criaria a agricultura, a pecuária, não teria absolutamente nada do que tem. Pense nisso, querido leitor.

E o que seria do mundo sem as artes? O homem, certamente, não contaria com esta fabulosa capacidade de “estocar” pensamentos, sentimentos e experiências para utilização de gerações que sucedessem à sua, pois não contaria com esta maravilha do intelecto, que é a escrita.

Lembrem-se que todos os alfabetos, sem exceção, surgiram de símbolos pictóricos. Ou seja, da pintura, que nada mais é do que uma das artes. O homem não teria como expressar emoções. Seria tomado por angústia tão intensa, que o conduziria à absoluta insanidade.

Não haveria música e nem dança para expressar alegria, tristeza, paixão, amor etc. Não existiriam pintura e nem escultura. E, claro, inexistiria a literatura. O mundo seria sombrio, pavoroso, chato, tedioso e sem graça. Sem a ciência, não haveria inteligência. Sem a arte, a emoção, sem válvulas de escape, findaria por fazer o homem explodir em ira e violência, avassaladoras e destrutivas. Seria o caos! Pense nisso.

 
* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk 



Um comentário: