quinta-feira, 18 de abril de 2013


Elite e massa

* Por Pedro J. Bondaczuk

As sociedades humanas, desde tempos imemoriais, sempre precisaram de líderes, de pessoas muito especiais, dotadas de iniciativa, com capacidade inata de comunicação e talento, para guiá-las. Em cima dessa necessidade é que se estruturaram as hierarquias --- desde as familiares (nos clãs), às tribais e posteriormente comunitárias e nacionais. Como ocorre com todos os animais, possivelmente até por questões genéticas, alguns indivíduos nascem com aptidões maiores do que outros. São os que normalmente constituem as elites. Quando não, transformam-se em rebeldes, em contestadores, em questionadores que não se submetem ao status vigente. São os revolucionários, fatores essenciais de mudanças, para o bem e para o mal.

A maioria da humanidade, no entanto, é integrada por pessoas comuns. É composta pelos que são incapazes de iniciativas ousadas ou de juízos mesmo que rudimentares. Necessitam de quem as oriente, proteja e guie. Fazem parte do padrão comum e são necessárias e indispensáveis. Constituem-se na força que concretiza as idéias da elite. Devem, portanto, ser credoras, em uma sociedade equilibrada e justa, dos mesmos direitos fundamentais dos que constituem a "nata" social.

Os estudiosos de ciências humanas (sociólogos, antropólogos, historiadores, etc.), convencionaram denominar essa multidão de "massa". A ilação é óbvia. É o conjunto passivo de ser moldado --- ou por idéias tidas por consensuais, ou pela tirania --- ao bel-prazer dos condutores. Em geral é manipulado, mediante os mais variados expedientes: pela força, pelo engodo, pelo suborno (o "panem et circenses"), etc. O recurso mais utilizado nesta época dita "de comunicação total" é o da propaganda. Esta induz, através de técnicas testadas e comprovadas, as pessoas a pensar e a agir de uma determinada maneira que a elite pretenda: consumindo o produto "x", seguindo a moda "y", apreciando o ritmo "z", adotando a ideologia "w" e assim por diante.

Alguns ditadores manipulam essa generalidade chamada "povo" por métodos mais cruéis e desumanos. Recorrem à atemorização, ao encarceramento, à tortura e às execuções sumárias contra os recalcitrantes. Conquistam, por outro lado, a lealdade irrestrita dos detentores da força, que os mantêm no poder. Foi o caso de Adolf Hitler, que com sua loucura quase destrói a civilização. O "füherer" alemão costumava dizer: "As massas são virgens histéricas, loucas para serem violadas". Uma perversidade, evidentemente. Mas ainda assim realidade.

O dramaturgo e poeta germânico, Friedrich Schiller, não escondia uma pontinha de rancor pela vulnerabilidade dessa torrente humana, base da pirâmide social, mas que por sua falta de clarividência, pela sua cegueira em enxergar o óbvio, impede, muitas vezes, a evolução humana. Em "Fiesque", deixou registrada esta magnífica citação: "O povo! esse colosso cego e sem discernimento que começa por fazer grande alarido com os seus pesados movimentos, cuja raiva devoradora ameaça engolir tudo! quer o que é elevado, como o que é vil! o que está longe, como o que está próximo! e que afinal vacila...sobre um fio!".

A civilização, em seus aspectos mais nobres, como a ética, o direito, a justiça social e a solidariedade, só evolui quando líderes iluminados e lúcidos conseguem conduzir esse imenso rebanho humano na direção do bem comum. Poucos, porém, são os povos e períodos que contam com essa felicidade. Daí a história apresentar recuos e avanços que se sucedem e se mostram intermináveis através de gerações. As pessoas consideradas "comuns" sequer têm culpa disso. São frutos da educação que recebem, determinada pela elite. Esta é que decide "para o quê" os indivíduos devem ser educados. Ou seja, condicionados.

Nelson Rodrigues, com a sua conhecida irreverência, expressou, com a crueza que lhe era peculiar, como agem as massas e o quanto são vulneráveis, influenciáveis e volúveis. Escreveu, em uma de suas polêmicas crônicas: "Ponha o cretino fundamental em cima de um caixote de querosene jacaré e mande-o falar. Ele dá  um berro e, imediatamente, milhares de cretinos fundamentais se arregimentam". A única forma de dificultar essa manipulação é fazer o povo pensar. Castro Alves via no livro o instrumento para tornar isso possível. Mas como convencer insensatos, acomodados, lerdos de raciocínio, os que sequer sabem a razão de estarem no mundo e que têm como supremo objetivo (e na maioria das vezes o único) a satisfação dos sentidos, da importância da leitura? Como fazer esse povo pensar?

* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk 

Um comentário:

  1. Com textos como este. Pega fundo e mesmo os insensatos vão pensar um pouquinho. O desafio é fazê-los ler, pois caso o escrito tenha mais de cinco linhas,"é longo demais. Leio mais tarde".

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