quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Paradoxal e incompreendido

Um empresário realista e eficiente, não importa qual a atividade de sua empresa (desde que lícita, claro), tem, como objetivo (não raro único) obter o máximo de lucro com o mínimo de despesas. Isso é para lá de óbvio. Ninguém investe em um empreendimento para empatar e muito menos para perder dinheiro, por mais idealista que seja. Alfred Nobel era assim. Ou seja, era um empresário metódico, organizado e eficiente. Daí ser bem sucedido.

Ocorre que o produto que fabricava e vendia, embora tivesse inegável utilidade civil, nas áreas de engenharia e de mineração, era, também, largamente empregado na indústria bélica. Governos de diversos países eram seus principais clientes. Abasteciam fartamente seus arsenais com os explosivos inventados e fabricados por Nobel. Ele, por sua vcz, mantinha observadores em várias partes do mundo, cuja função era manter contato com potenciais clientes. E sempre que possível, se empenhava para vender seus explosivos imparcialmente, quando da eclosão de guerras, e às duas partes em conflito.

É essa “eficiência empresarial” – que seria elogiada caso o produto que vendesse fosse outro que não o que vendia de fato, passivo de uso militar – que os opositores de Nobel, os do seu tempo e os de hoje, mais condenam em sua atitude. Valem-se dela para impor restrições à sua figura e à sua importância.

Externamente, para uma pessoa que não o conhecesse na intimidade e o julgasse somente pela aparência, a impressão que ele passava era a de um empresário frio e implacável, de um industrial insensível e alienado, desses que só viam cifrões à sua frente e cujo objetivo único era o de obter lucros e mais lucros, sem se importar de que forma.

Já quem conviveu com Nobel – como foi o caso da baronesa Bertha Von Suttner, aliás ferrenha e incansável pacifista e, portanto, de opinião insuspeita – essa imagem dele é enganosa, injusta e falsa. Por trás da sua aparência carrancuda e empedernida, interpretada, apressadamente, como arrogância e prepotência, havia, no entender dessa notável mulher (uma das raras amizades de fato do cientista e industrial), um homem sensível, amável, terno e, sobretudo, idealista. Um aspecto pouco mencionado (ou totalmente ignorado) em suas várias biografias, até naquelas mais favoráveis, é a característica de filantropo de Alfred Nobel. Ele costumava enviar, periodicamente, cheques com enormes somas, desses cheios de zero à direita de um número elevado, a dezenas de instituições de caridade e assistenciais dos mais diversos países da Europa, coisa que, convenhamos, nenhum empresário “empedernido”, que vise exclusivamente obter todo o lucro possível, não faria, não fazia e nem faz.

Bertha referiu-se muitas vezes a essa generosidade sem ostentação nas cartas que escreveu. Só que, em vez de fazer intensa publicidade das suas doações, Nobel fazia de tudo para que isso não chegasse jamais ao conhecimento da imprensa. Por que? Creio que só ele poderia responder. Quanto aos sentimentos que o moviam, era o mais discreto possível. Procurava disfarçá-los, criticando a humanidade. Dizia que o mundo só melhoraria de verdade e ser tornaria pacífico e justo “quando as pessoas nascessem com mais inteligência”.

Ademais, não perdia, também, nenhuma oportunidade para desfiar amargos e ácidos comentários, carregados de profunda descrença, sobre o comportamento injusto e perverso de políticos, de governos e de sociedades, recheando suas dissertações com frases espirituosas e irônicas. E suas críticas eram recebidas com inegável antipatia.

Esse Alfred Nobel, convenhamos, era um sujeito um tanto “exótico”, excêntrico, bizarro até em sua maneira de ser e de viver. Era um figuraço! Solteirão convicto e inveterado, devotado à ciência, vivia cercado de conforto e facilidades, ou seja, do bom e do melhor que o dinheiro pode comprar. Embora sua alimentação fosse a mais frugal possível, tendo em vista seus problemas digestivos, decorrentes da inalação de fumaça de nitroglicerina, anos atrás, mantinha a seu serviço os melhores e mais famosos cozinheiros da Europa. Gostava de cavalos de raça, tinha dezenas deles, além de luxuosa carruagem – que hoje equivaleria à posse de uma BMW ou de uma Ferrari ou de uma Mercedes – na qual dava longos e solitários passeios pelos parques de Paris, onde viveu por muitos anos.

Não apreciava os saraus literários, tão em voga na época, que considerava fúteis e inúteis. Mesmo assim, freqüentava-os com certa assiduidade e não escondia sua preferência pelos bons poetas e, principalmente, pela boa poesia. Apreciava, também, o teatro, mas sua fixação era pela filosofia. Era desses tipos de que acabamos por gostar algum dia, mas apenas depois de longa convivência. Era, porém, desses raros sujeitos que, depois de nos afeiçoarmos a eles, nunca mais os conseguimos esquecer e prescindir de sua companhia.

Boa leitura.

O Editor.

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