quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Precisamos de certezas

* Por Pedro J. Bondaczuk

A maior tortura que temos, provavelmente, na vida é a incerteza, seja lá do que for. Todavia, ela é a grande característica dessa aventura magnífica, que é a possibilidade de viver. Nunca estamos absolutamente certos de quase nada (diria, para ser mais exato, de nada mesmo). Não temos certeza de que a profissão que escolhemos é a mais adequada, de que a decisão que tomamos (não importa de que natureza) é a correta, de que o amor que dedicamos a alguém é plenamente correspondido (mesmo que as manifestações dessa pessoa, seus atos e reações, dêem essa indicação) e vai por aí afora.

No caso dos relacionamentos, a prova de que nunca estamos seguros da plena correspondência da amada é o sentimento do ciúme, que todos temos em algum momento, posto que em intensidades variáveis, de acordo com nossa formação e personalidade. Todos somos, em algum momento, aquele personagem de William Shakespeare, o Iago, desconfiados da fidelidade da nossa Desdemona particular.

Certeza, mesmo, só tenho duas e ambas baseadas exclusivamente na lógica: a da existência, imanência, transcendência e eternidade de Deus (não exatamente com as características que o vulgo Lhe atribui) e de que um dia, que não sei quando, vou morrer. No mais... Tudo é incerto, duvidoso, passivo de comprovação. E quando comprovamos alguma coisa, a prova nunca é cabal, irretorquível, absolutamente convincente, sem nenhum aspecto obscuro carente de maior esclarecimento.

Qual é a fonte dessa compulsória incerteza? É, sem dúvida, o desconhecimento. Fôssemos oniscientes, não haveria o mínimo espaço para o duvidoso, o misterioso e o incerto. A ciência humana (ou o que entendemos como tal) ainda é muito rudimentar para nos dar já não digo todas as respostas, mas pelo menos as elementares.

A todo o momento, conceitos tidos e havidos como verdadeiros – não raro, como dogmas imutáveis – são derrubados e substituídos por novas descobertas. Até meados do século XIX, por exemplo, vírus e bactérias eram desconhecidos e as pessoas acreditavam, sem pestanejar, na “geração espontânea”.

Foi preciso o trabalho paciente (e competente) de um Louis Pasteur para demonstrar que isso era absurdo. Que apenas vida pode gerar outra vida. No Século XVI, quem dissesse que a Terra era redonda e orbitasse o Sol (e não o contrário), seria tido como insano, se não como herege. Galileo Galilei Galileu que o diga. Pagou duríssimo preço por afirmar o contrário do que era dogma da Igreja.

Nosso conhecimento sobre o mundo que nos cerca, embora achemos que seja extraordinário, é ínfimo, ridículo, pífio, diante do que há, ainda, por aprender. Imaginem em relação ao universo! Portanto, convém não sofrer em demasia com as incertezas. É prudente, sobretudo, não as transformar em “doenças do espírito”.

Haveremos de conviver com elas – múltiplas, variáveis, intensas ou fracas – enquanto vivermos. Morris West escreveu, a respeito, no romance “O Verão do Lobo Vermelho”: “O povo precisa de certezas. Até a certeza de morrer é uma ajuda para muitos. A doença do espírito é uma doença de desconhecimento e incerteza”.

Se as incertezas, porém, são um tormento (e de fato são), não deixam, por seu turno, de ter também um lado positivo. São, ao lado da necessidade, as grandes propulsoras do progresso. É em busca de certezas que pesquisamos, inquirimos, procuramos, estudamos, nos esforçamos às vezes até o nosso limite e nos expomos às mais variadas experiências, na busca da verdade (ou do que julgamos como tal).

Ela é a inesgotável fonte da Filosofia, a “mãe de todas as ciências”, que nos desafia, desde o princípio dos tempos, a responder três questões fundamentais: o que somos, de onde viemos e para onde vamos? Respostas para essas aparentemente simples (no entanto, intrigantes) perguntas foram dadas milhões de vezes, por milhões de pessoas, em todos os tempos e lugares. Nenhuma delas, todavia, soou convincente.

Persiste a incerteza. E, por persistir, gerações e mais gerações (se o homem não se destruir antes e não eliminar a vida do Planeta), seguirão com forte motivação para estudar, perquirir, pesquisar, procurar e se esforçar ao limite máximo de suas forças em busca da verdade. Preciso, como todos, de certezas. Onde e, principalmente, como obtê-las é a questão que me desafia e continuará a desafiar enquanto permanecer na Terra, vivendo essa aventura incerta e, por isso, tão fascinante.

* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk

2 comentários:

  1. A dúvida pode ser melhor do que a certeza. Em ambas a angústia fere, no entanto, na certeza fere mais. Somos poeira cósmica e não temos importância nenhuma. Isso apazígua seu espírito?

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  2. Note que afirmei que precisamos de "certezas", mas não de "todas" as certezas. Há coisas que é melhor que permaneçam duvidosas. E há milhões de tantas outras cuja certeza a propósito jamais conseguiremos obter, mesmo que desejemosd ardentemente. Obrigado por comentar, Mara. Senti sua falta nos últimos dois dias.

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