quinta-feira, 19 de julho de 2012

Eu e os zumbis


* Por Fernando Yanmar Narciso

Foram necessárias muitas luas, mas aconteceu de novo: As ruas voltaram a ficar desertas na hora da novela... 39 anos após a mestra Janete Clair ter extraído inigualáveis 100 pontos de ibope(!) na noite em que Cristiano Vilhena (Francisco Cuoco) descobriu que Rosana Reis era sua ex-noiva Suzana Marques (Regina Duarte) na histórica novela Selva De Pedra - Caracas, era só uma peruca loira!

27 anos após Dias Gomes ter puxado o tapete do país e unido Viúva Porcina e Sinhozinho Malta em sagrados matrimônio e sarapatel e 21 anos depois de Gilberto Braga ter feito a revelação da assassina de Odete Roitman no 1º bloco e ter preenchido os demais blocos do último capítulo de Vale Tudo com puro embromation, o povo brasileiro enfim voltou a se unir em torno de um “bem maior” folhetinesco.

E o culpado por isso é o novelista João Emanuel Carneiro com a sua, como há muito tempo não se via, instigante novela Avenida Plasil. Carneiro é o novo autor “king of cool” da Globo, posto ocupado por Silvio de Abreu desde os anos 1980: O tipo de autor descolado, anarquista, pretensioso e possivelmente alcoólatra. Hum, parece até que acabei de me descrever...

Revistas de fofoca noveleira nunca venderam tanto como neste ano, programas matinais e vespertinos trazem lacuntrias e discussões diárias a respeito da trama, e o próprio JEC- Apelido dado ao autor pelas fãs- deu uma entrevista bombástica às páginas amarelas da Veja, varrendo pra debaixo do lixão cenográfico todos os novelistas que vieram antes dele. Cheguei até a encontrar na internet um relato, talvez verídico, de uma colunista que se propôs o desafio de ficar uma semana sem assistir à bendita. Ela faltou roer as próprias canelas, tamanha a crise de abstinência. A coisa ficou tão feia que até posso ver as várias clínicas de reabilitação que serão abertas quando a novela acabar, ela parece viciar mais que crack.

E o que essa novela tem que deixou nossos pobres alienados brasileiros ainda mais alienados? Sinceramente, eu não sei. Até onde eu compreendo a trama, por tudo que leio por aí e pelos caquinhos que pego no ar, o estilo autoral de JEC se assemelha a empilhar melancias no topo de uma ladeira. Quando a pilha de idéias/melancias atinge a altura do Everest, ele resolve dar um empurrão nela e ver no que dá. O nonsense é quase absoluto no enredo, mas parece que ninguém liga pra isso.

Não há uma única pessoa digna de confiança em toda aquela favela fictícia. Deixaria uma raposa cuidando de meu galinheiro, mas não deixaria nenhuma daquelas pessoas cuidando de nada meu. Metade dos moradores do Divino eu não quero por perto, e a outra metade também não.Pelo que tenho ouvido por aí, os pobres, suposto público-alvo da novela, NÃO A SUPORTAM. Acham-na escarnecedora e preconceituosa com a classe C, com seus embates diários de neuras e discussões a altos decibéis que mais parecem uma sinfonia de vuvuzelas, que segundo tais telespectadores em nada se assemelham à realidade.

Já virou um hábito dos autores da novela das 9 dizer que, a partir de capítulo tal, todo o universo que a audiência conhecia sobre a trama vai deixar de existir. Tal prática foi criada pela própria Janete Clair na mesma Selva de Pedra em 1972, mas quando ela o fazia, suas tramas ainda mantinham a coerência de quando começaram, ao contrário de agora, que o capítulo derradeiro é usado mais para limpar a área que para qualquer outra coisa. A esta altura do campeonato, já começamos a contagem regressiva para o alardeado capítulo 100 de Avenida Plasil, onde Carneiro prometeu esclarecer todos os “enigmas” e colocar heroína e vilã (até o momento, papéis indefinidos) frente a frente para o primeiro acerto de contas. Ainda bem... Boa parte da audiência já não agüenta mais o relacionamento João- teimoso de Nina e Jorginho, nem ver o Leleco praticamente implorando de joelhos por um par de chifres, nem Cadinho e suas três peruas intoleráveis, e, principalmente, não suportam mais ver o pobre coitado do Jorge Araújo, vulgo Tufão -Sim, esse é o nome verdadeiro dele, sabiam? Sempre achei que fosse Tufo Da Silva...- ser feito de gato e sapato por Carminha, sua maquiavélica e burrinha esposa. Ô, JEC? O Brasil está todo do seu lado de novo! Não inventa de empurrar as melancias logo agora!

*Designer e escritor. Site: HTTP://terradeexcluidos.blogspot.com.br

3 comentários:

  1. Está bacana, chique e engraçado. Gostei demais!

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  2. É Fernando, ainda há quem acredite que exista vida inteligente na Terra...affffffffff. Buenas, sabes que não assisto novela, já te disse isso, mas a pasmaceira
    televisiva irradia, transcende, contamina. Mesmo que eu me tranque no quarto secreto sou atingida por fragmentos novelísticos. Uns e outros ousaram crer
    que a trama seria boa, por conta da temática inicial, mas, escorregaram. Se eu espero que melhore? Não mesmo, não vou ser cobaia desses pseudo escritores.
    Abração amigo.

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  3. Algum tempo já fui "noveleiro" (rs). Hoje não acompanho mais. Concluí que há muita "apelação" pela ambicionada audiência... Mas novela é viciante mesmo.
    É bastante curioso tudo que descreve aqui, e gosto do seu estilo de escrita. Parabéns"

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