sábado, 28 de maio de 2011



Desafiando a natureza


A humanidade é confrontada, neste início da segunda década do século XXI, com um sem número de problemas, cuja solução se torna cada vez mais premente, mas que não se vislumbra como algo que esteja sequer minimamente próximo de ocorrer. Pelo contrário, entra ano sai ano, entra década sai década, entra século sai século e nada de se encontrarem saídas para os impasses que ameaçam e confrontam a espécie.

Questões que remontam ao princípio do que convencionamos chamar de civilização, como injustiça social, desastrosa distribuição de riquezas geradas por diversas sociedades nacionais, guerras estúpidas e sem sentido (todas são), fome, miséria, desesperança das massas, preconceito de raça, cor, sexo e religião, violência doméstica e urbana e outras tantas mazelas, tão antigas quanto o próprio homem, permanecem mais presentes do que nunca no comportamento cotidiano. Com uma agravante: a população mundial multiplicou-se por sete, desde o início do século XX e segue aumentando em progressão geométrica, enquanto os meios para mantê-la viva crescem em progressão aritmética. E isso considerando-se que não haja distorções, como a da concentração das finitas riquezas da Terra em cada vez menos mãos. Mas... evidentemente há.

De todos os problemas que ameaçam a sobrevivência da espécie, e o mais relegado a um plano secundário, destaca-se o da superpopulação. A reprodução é um dos instintos básicos de toda e qualquer espécie de vida, quer a unicelular, quer as estruturas mais complexas, como os animais, entre eles o homem. É um processo que ocorre à revelia, tanto dos irracionais, quanto do único ser vivo dotado de razão. A natureza, todavia, tem mecanismo próprio para evitar que determinada espécie se reproduza em quantidade maior do que os recursos necessários à sua sobrevivência. Utiliza-se dos predadores. É um processo cruel, mas inflexível e necessário.

O homem, ao longo de milênios, também já chegou a ser presa. Todavia, o recurso magnífico de que é dotado, a inteligência, fez com que provesse formas de defesa que lhe garantiram a sobrevivência. Fabricou armas e abrigos seguros, por exemplo. E foi mais longe: tornou-se, ele, o predador dos seus antigos predadores. Tanto que já provocou a extinção de um número muito grande de espécies e outras tantas correm sérios riscos de desaparecer.

Os predadores mais resistentes que o ser humano ainda tem, são invisíveis a olho nu: os vírus e bactérias, que o atacam no interior do próprio organismo, afetando seu funcionamento normal, causando-lhe o colapso (doenças) e levando-o, afinal, à morte. Mesmo estes, no entanto, vêm sendo, paulatinamente, vencidos, mediante medicamentos cada vez mais potentes e eficazes, práticas de higiene simples, mas eficientes, desconhecidas num passado ainda recente e técnicas médicas cada vez mais bem-sucedidas para seu restabelecimento. Não é por acaso, pois, que a espécie teve (e tem) explosiva multiplicação em decorrência desses avanços na luta contra seus invisíveis predadores.

Claro que, como indivíduo, cada um de nós faz tudo o que for possível para sobreviver, e o máximo de tempo que conseguir. É instintivo. E vamos mais longe, empenhamo-nos para preservar nossas características genéticas básicas na nossa descendência. Ocorre que o que é bom no plano individual pode não o ser no coletivo. A existência de mais pessoas no mundo implica em maiores necessidades. O Planeta, porém, tem limites, tanto espaciais, quanto de geração do que é essencial à vida humana. E, a própria lógica sugere, já estamos nos aproximando celeremente deles que, a rigor, não conhecemos com precisão quais são.

Jacques Maritain escreveu sobre nossa condição individual e, simultaneamente, coletiva, ou seja, como partes de um todo: “Cada ser humano é um indivíduo como o animal, a planta, o átomo, fragmento de uma espécie, parte singular da imensa rede de influências cósmicas, étnicas e históricas que o dominam. E ao mesmo tempo é uma pessoa, quer dizer, um universo de natureza espiritual, dotado de livre-arbítrio e, como tal, um todo independente em face do mundo”.

E quem foi esse ilustre pensador? Jacques Maritain, que faleceu em 22 de abril de 1973, foi um filósofo francês, de orientação católica (era da escola tomista), que, entre outras coisas, influenciou a ideologia da democracia cristã. Produziu muito, legando à posteridade mais de 60 livros.

Um dos escritores que mais se preocuparam com a questão da superpopulação, foi o inglês Aldous Leonard Huxley, falecido dez anos antes de Jacques Maritain, em 22 de novembro de 1963. Foi um dos mais festejados e aclamados romancistas do século XX, cuja obra mais lida e mais citada é “Admirável mundo novo”. Li, desse autor, além desse livro, “Contraponto”, “Sem olhos em Gaza”, “Ronda grotesca”, “Volta ao admirável mundo novo”, além dos ensaios “As portas da percepção” e “A situação humana”.

Mesmo que contestemos algumas de suas teses, foi um dos ficcionistas que mais tratou de temas polêmicos, sobretudo de projeções do futuro. A propósito da “bomba populacional”, a seu ver, potencialmente mais letal que as armas nucleares, Huxley escreveu o seguinte, no romance “Volta ao admirável mundo novo”: “É diante desse sinistro cenário biológico que se desenrolam os dramas políticos, econômicos, culturais e psicológicos do nosso tempo. À medida que se escoar o século XX e os novos bilhões se acrescentarem aos já existentes (haverá mais de cinco bilhões e meio de homens quando minha neta tiver 50 anos) este cenário biológico avançará”.

E acrescentou, mais adiante: “O problema dos números, que rapidamente se multiplicam em relação aos recursos naturais, à estabilidade social e ao bem-estar dos indivíduos, é a questão fundamental da humanidade; e permanecerá sendo o problema crucial por outro século e talvez por muitos outros séculos no futuro. Supõe-se que uma nova era se iniciou a 4 de outubro de 1957. Porém, no contexto presente, toda a nossa exuberante conversa pós-Sputnik é irrelevante. Se tomarmos como ponto de referência as massas de humanidade, a era vindoura não será a Era do Espaço e sim a Era da Superpopulação”.

E não é o que ocorre, sem que o tema sequer seja objeto de debate nos meios de comunicação, a não ser incidentalmente, e para ser rebatido com ênfase pelos que se julgam acima do bem e do mal que, todavia, não passam de alienados? Qual o limite de pessoas que a Terra comporta, sem que a civilização e a natureza entrem em colapso e a espécie se veja confrontada com o risco de extinção? Nove bilhões? Dez bilhões? Doze bilhões? Dezesseis bilhões? Ninguém sabe! E, desgraçadamente, poucos, pouquíssimos se interessam em saber.

Boa leitura.

O Editor.

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Um comentário:

  1. Contribui pouco para a superpopulação. Tive apenas um filho. E pensando nela. Mas quem pensa coletivamente? Apenas os japoneses.

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