terça-feira, 22 de junho de 2010




Fiteiro Cultural

** Por José Calvino de Andrade Lima


Fiteiro: Que ou aquele que faz fita.

No Brasil, fiteiro é um quiosque de comércio popular, desses que podem ser encontrados em praticamente todo o país e que vendem uma infinidade de coisas.

No centro do Recife, fora montado um Fiteiro Cultural, onde tentei em vão ilustrar com literatura os frequentadores dos bares próximos. Numa sexta-feira à noite, por esquecimento, deixei alguns livros dependurados no lado de fora. No sábado pela manhã, preocupado, fui à toda pensando em não mais encontrá-los. E não é que estavam lá todos a salvo! Aos malandros e bêbados não interessara aquela riqueza de livros expostos, alguns até raros. Infelizmente alguns escritores, poetas e leitores, ao mostrar o FC saíam às pressas, parecia até que estava mostrando a porta do inferno... Mas essa é outra história.

No mundo inteiro a literatura é importante, mas devido à indiferença de alguns, escrevi em agosto de 2009 o poema: “Curiosidade”

Eu não sei como fazer/ essa poesia curiosa./ Será que vai dar certo?// Como uma razão para viver,/um motivo para continuar.../ Ao som de uma percussão ritualística.// Como você pode ver:/ Recomendaram-me que eu fechasse// O Fiteiro Cultural.

Resolvi distribuir diversos livros que se encontravam no FC. Menos os que foram presenteados, é claro, estes ficaram para a minha estante de mármore.

Primeiro escolhi o romance “A Cruz de Sangue”, de Geraldo Tenório Aoun (in memoriam). Edição do autor – 1995. O segundo romance ,“Sombras de uma Profecia”, de Lucelena Maia. Edição SCORTECCI Editora – 2005.

01 – A Cruz de Sangue*

“Eita, cabra bom da peste”. Geraldo Tenório Aoun, escritor, sertanejo-brasileiro, escreveu o seu novo livro “A Cruz de Sangue”. Em tela, Geraldo escreve sobre o homem brabo da região sertaneja, homens de grande fé e seus temores a Deus, suas crenças, as lutas entre famílias, muito comum no sertão de Pernambuco. Geraldo Aoun narra um mosaico de uma vida atribulada de Janja Bacamarte, protagonista desse agradável romance. Quanto à maneira como Geraldo escreveu esse livro é de admirar a difícil tarefa na ingrata arte de escrever em nossa discriminada região nordeste, sem apoio de órgãos competentes. Conforme o prefácio, Geraldo é filho de libanês com uma jovem de Pesqueira interior de Pernambuco. É um dos escritores pernambucanos que fazem da sua profissão um verdadeiro sacerdócio. Colaborador do Jornal do Commercio descarrega todas as suas energias de encorajamento na conquista à baila das letras, onde, acredito, não faltam leitores de bons livros. “A Cruz de Sangue”, por exemplo, deveria ser indicado para os trabalhos acadêmicos sobre o homem do Sertão principalmente. Se me permitem uma palavra pessoal: É sem dúvida um trabalho de fôlego, uma grande obra literária do “homem sertanejo”.


*Geraldo Aoun, escritor sertanejo, foi colaborador do JC durante muito tempo. Gostava de enaltecer a nossa cultura, participava de eventos e transmitia para os jovens. Seus livros deveriam ser indicados para trabalhos acadêmicos sobre o Sertão.


02 – “Sombras de uma Profecia”, em que a escritora paulista Lucelena Maia criou uma história de mão cheia, com um título que teve por inspiração o misticismo na enigmática Índia. Constitui-se um romance bem distribuído com a característica de um espírito agudo, penetrante, que capta inteligentemente os mistérios daquele país. Sem contudo nunca a autora ter visitado aquele país, antes e nem depois (até junho de 2009) de “Sombras de uma Profecia”. Numa seqüência agradável, de fácil leitura, sem ser “à la” submissão. A obra desenvolve-se em uma trama saborosa, com a colocação de choques, concepções e decepções abertos ou resguardados como segredos..., a enfrentar gerações e centrados nos relacionamentos amorosos. O romance “Sombras...” poderia ser elevado à categoria de estudo sociológico, para empregar o amor como um todo, com uma riqueza humana que, as poesias de Dante Milano, Casimiro de Abreu, Castro Alves, Fernando Pessoa, Cecília Meireles, Laurindo Rabelo, fizeram parte da história da personagem central, poemas que a conduziu com muita energia para enfrentar tempestades pessoais. E com o final de sua autoria: “Cata-Vento”, que formam enriquecendo a sua real contribuição à Literatura Brasileira.

Permita-me:

Cata- Vento*

Leva-me pro vento,/ Memória, me leva.../ Pra linha do tempo,/ Lá, eu tenho história,/ Reservas da vida/ Que não se traduzem,/ Acervo somado/ A tanta emoção:/ Escrita co’os olhos,/ Firmada co’a alma,/ Vivida a dois,// Leva-me pro vento,/ Memória, me leva.../ ao túnel do tempo,/ Urgência que eu tenho,/ De ver meu enredo,/ Mudar os mistérios,/ Os vícios inglórios,/ Alegre avental,/ Fechado no peito,/ aberto ao despeito,/ Velado no armário,/ Leva-me pro vento,/ Memória, me leva.../ Cruzando o silêncio,/ Gritando meus medos,/ Soprando-os à sorte,/ E pondo-me inteira,/ Segura e fecunda,/ No leito da estrada,/ Ousando pegadas/ Escritas co’os olhos,/ Firmadas co’a alma.

*Primeiro livro de poemas de Lucelena Maia – pp. 26/27 – “Põe-te de pé, poeta!”
Excelente, para o que se propõe, o romance “Sombras de uma Profecia” e “Põe-te de pé, poeta!”, de Lucelena Maia.


** Escritor, poeta e teatrólogo

3 comentários:

  1. Já me embrenhei nesses lugares
    a ponto de esquecer da vida mas
    infelizmente Zé, não é uma cultura
    muito assediada.
    Beijos poetamigo.

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  2. E o pior é que muitos escritores e poetas
    são subservientes aos poderosos da cultura.
    São ligados à indústria Cultural do eixo Rio/São Paulo.
    É uma vergonha!
    Parabéns Zé Calvino.
    Beijos,

    Dilma Carras

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