sábado, 17 de abril de 2010




Permissão para ficar

* Por Ruth Barros

Anabel tem zilhões de primos, a maior parte já entrada em anos (sem trocadilho), tanto que casamento chez les Serranegra nos dias de hoje só rola com filho de primo. A primeira geração chegou em um ponto de idade que quem casou casou, quem não casou não casa mais. A fila da geração nova, os ainda desencalháveis, andou. Casou o filho mais velho de uma das primas na semana passada. Teve uma festa de arromba em Franca, interior de São Paulo, terra da noiva, que atraiu ônibus lotados (assim mesmo, no plural) de gente de Belo Horizonte, uns simpatizantes do Rio e uns gatos pingados de São Paulo, fora delegações estrangeiras, mas essas não entram nessa história.

Tudo foi muito bem, mas sabe como é, festa de família é a maior bandeira, todo mundo vê tudo (se não vê imagina e inventa) e sai contando no dia seguinte. Isso talvez tenha inibido um pouco as garotas – nenhuma delas ficou com ninguém. Já um primo do noivo, bem novinho, com uns 15 anos (o primo, não o noivo), ficou com uma garota.

Eu e a mãe do ficante – e a família inteira, pois todo mundo acabou sabendo e, como qualquer família que se preza, todos deram palpite – nos impressionamos em ver como o mundo mudou e como tudo continua igual. Prova da evolução dos tempos, a mocinha, durante a festa pediu ao pai dela permissão para ficar – imaginem pedir ao pai para poder ficar!!! A gente mal conseguia namorar oficialmente sem que o pai atormentasse. Se (e quando) ficava, o que em tempos idos se chamava malho, sarro ou amasso, tinha que ser escondido inclusive das amigas, porque pegava mal.

Prova de que nada mudou, o pai não deixou e a garota ficou do mesmo jeito. Não se pode nem dizer que ela desrespeitou o pai, pelo contrário. O respeito, o carinho e a confiança são tão grandes que chegou a pedir a bênção dele para ficar. Agora, já que foi negada, ela fez o que qualquer moça sempre fez, em qualquer época da história da humanidade, ou seja, agir de acordo com a própria cabeça ou com o próprio tesão e desobedecer ao pai.

O mundo sempre foi assim, Romeu e Julieta são prova literária disso. Sinto dizer que lamento pelos que não concordam e convido a atirar a primeira pedra quem nunca na vida namorou (ou ficou, vá lá) escondido.

Anabel Serranegra espera ansiosa pela festa de centenário dos primos Fernando e Moacyr, que vão completar 50 anos cada um


* Maria Ruth de Moraes e Barros, formada em Jornalismo pela UFMG, começou carreira em Paris, em 1983, como correspondente do Estado de Minas, enquanto estudava Literatura Francesa. De volta ao Brasil trabalhou em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes e Jornal da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela revista Flash, com o pseudônimo de Anabel Serranegra.

Um comentário:

  1. Que texto suave.
    Bem, te confesso que não "ficava", mas namorava
    escondido e como me arrependo, ele era mais novo
    do que eu e contou para todo mundo na escola.
    Um mês de castigo e nem valeu a pena.
    Adorei seu texto.
    Abraços

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