segunda-feira, 30 de novembro de 2009




Surpresa de esposa

* Por Celamar Maione


Três da madrugada. Subiu as escadas cambaleando. O hálito de cerveja o incomodava. O estômago apertava. A cabeça girava. Antes de entrar em casa, pegou uma bala de hortelã e colocou na boca. Procurou a chave no bolso da calça. Nada. Procurou no bolso do paletó. Ouviu um barulhinho.Finalmente. Pegou e rodou a chave na fechadura, devagar, para não fazer barulho.

O Poodle da vizinha latiu. Deu um pulo para trás. Prometera a Elvira nunca mais chegar tarde. Ela o ameaçara. Terminaria o casamento se acontecesse de novo. Não queria trair a esposa. Mas não resistiu. Tinha a cabeça mole demais. As mulheres eram seu ponto fraco. Elas o provocavam. Tinha imã. Atraía mulheres de todos os tipos e idade. A loira era linda. Um fenômeno. Acenou com o olhar enquanto atravessavam a Avenida Rio Branco. Os bicos dos seios endurecidos na blusa transparente lhe deram vertigem. Quase morre atropelado. Ela o puxou para a calçada antes que o ônibus o deixasse no asfalto . Estavam embriagados de tesão.

Fez o convite. Beberam e gargalharam como velhos conhecidos. Terminaram a noite num motel ordinário no Centro da Cidade. Quase três da manhã lembrou-se de Elvira. O coração acelerou. Deixou a loira perto de casa. Fingiu que anotou o telefone no celular. O aparelho estava desligado.

Abriu a porta. Colocou os pés na sala com o coração acelerado. Deu um pulo. A luz do abajur clareou o rosto de Elvira. A esposa estava com os olhos trepidando de ódio. Um sorriso de mulher mofada na boca pequena. A cadeira de balanço rangia. Nas mãos, ela segurava uma arma. Lambia os beiços. Passional. Desgovernada. Num gesto de desespero, tentou desarmá-la. Só que, enquanto ele saía com as outras, ela treinava pontaria. Um tiro no coração. Sem barulho . Eficaz.

Com pose de vilã de filme de bang-bang, saiu da cadeira, chutou o corpo com cara de nojo, cuspiu no rosto do morto, colocou a arma dentro da mala, trancou a casa e desceu as escadas em silêncio. Na calçada, um Monza 89 esperava-a com os faróis ligados. Na direção, uma mulher com o cabelo pintado de duas cores fazia sinal . Entrou no carro. Olharam-se cheias de cumplicidade. A motorista partiu apressada. Elvira respirou aliviada. Missão cumprida.

*Radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador , mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

10 comentários:

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  2. Ceder, ceder, ceder...enquanto isso
    a mágoa e o ressentimento se instalam.
    Não mais há espaço para o perdão.
    Cheguei a prender o fôlego Celamar!
    Parabéns!

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  3. Aqui se faz, aqui se paga. Mais um texto cheio de tramas e insinuações. Quem presta para o que, neste mundo cheio de interesses e desejos obscuros? - é o que a autora pergunta sempre provocativa. Parabéns.

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  5. Nubia e Daniel, obrigada aos dois pela leitura sempre atenta. Beijos
    Marco, eu deixo por conta do leitor. Obrigada pela leitura e pelo seu comentário .
    Gustavo, peço que não use o espaço para falar mal da Editora que vai publicar o meu primeiro livro. Você está insatisfeito ? Então, por favor, entenda-se com eles. Gostaria de encerrar o assunto por aqui. Desculpe, mas achei infeliz a sua colocação. Abraços.

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  6. Que historia, Celamar! De tirar o fôlego...
    beijos

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  7. A sua passionalidade Celamar é mais intensa e elétrica do que as outras. Oprime num crescendo, até o suspiro de alívio. Uma mulher ferida e irracional não precisa ter um motivo imediato. As loucuras são inexplicáveis. Adorei o "desgovernada". Perfeito!

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  9. Nossa, como vc é má!... O coitadinho só não sabia resistir ao charme feminino, oras...

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