domingo, 25 de outubro de 2009




Manobra outonal

Por Ingeborg Bachmann

Eu não digo: foi ontem. Com dinheiro de verão
Desvalorizado no bolso estamos novamente
No debulho do escárnio, na manobra outonal do tempo.
E a saída de emergência para o sul não nos é,
Como aos pássaros, favorável. À noite,
Passam barcos pesqueiros e gôndolas, e às vezes
Me atinge um estilhaço de mármore cheio de sonho,
Onde sou vulnerável, através da beleza, no olho.

No jornal leio muito sobre o frio
E suas conseqüências, de mórbidos e mortos,
De desalojados, matanças e miríades
De pedaços de gelo, mas pouco sobre o que me agrada.
E por que deveria? Para o mendigo, que vem ao meio-dia,
Fecho a porta na cara, pois é tempo de paz
Pode-se poupar tal visão mas não
Na chuva a morte infeliz das folhas.

Vamos fazer uma viagem! Vamos ver debaixo dos ciprestes
Ou também das palmeiras ou das plantações de laranjas
A preços reduzidos o crepúsculo inigualável!
Vamos esquecer as cartas não respondidas ao ontem!
O tempo faz milagres. Mas quando nos alcança em momento errado
Com o pulsar da culpa: nós não estamos em casa.
No porão do sentimento, sem dormir, me encontro
No debulho do escárnio, na manobra outonal do tempo.

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