terça-feira, 21 de abril de 2009




Quando Teresa chovia


* Por Evelyne Furtado


Teresa choveu dias seguidos. Ora tempestade, ora neblina, ela chovia. A chuva, em determinada época, era tanta que seus ossos tremiam, como tremiam seu queixo, sua fala, sua vida.

Vez ou outra tinha a sensação de que a estação chuvosa havia parado, mas bastava uma pinçada no coração para que suas nuvens produzissem mais chuvas. A chuva de Teresa tinha como matéria-prima sonhos desfeitos, mas caía em doce devaneios também. Continha frustrações, impotência e ira, porém trazia deleites e esperança no seu molhar.

Às vezes Teresa ria de si mesma, vendo-se como uma personagem de gibi que andava com uma chuvinha particular sobre si, pois chovia em casa, no cinema, no carro, no shopping e na rua. Quando sorria era chuva com sol. Casamento de raposa com rouxinol, como dizia sua mãe.

Teresa sentia-se bem quando acordava um dia bonito. Em dados momentos quase foi arco-íris, porém, antes da tarde terminar voltava a chover. Teresa não se conformava em ser chuva e usou métodos diversos para não mais chover. Desenhou sol de farinha, rezou a Santa Clara, chamou São Pedro para uma conversa íntima. Cantou e dançou para estiar.

Aos poucos Teresa, entendeu que a sua chuva era a parte de si que a conhecia melhor. Cada gota vertia um sentimento que nem mesmo ela imaginava existir. A chuva sabia demais por isso Teresa chovia.

Chuva abençoada a dessa moça. Veio como o dilúvio para lhe renovar. Levou o que ela não poderia mais reter, inundou para desencardir e regou sua alma para o plantio. Atualmente Teresa faz calor, faz frio, faz tempo bom e chove nas horas certas para amenizar a aridez que lhe cerca em alguns dias.

* Cronista e poetisa em Natal/RN

9 comentários:

  1. Choveu foi poesia neste texto de superior inspiração e criterioso emprego de palavras que criam imagens altamente delicadas, femininas. E, quem diria, além de tudo, as mulheres são também meteorológicas! Que coisa, sô! Parabéns, Eve.

    ResponderExcluir
  2. Quanta poesia, Evelyne !
    Que linda é Teresa na sua chuva de emoções.
    Adorei.
    Bjs

    ResponderExcluir
  3. Só o título já é um poema, na musicalidade e no ineditismo da imagem que evoca. Do texto então, nem se fala. Seria chover no molhado! Um beijo e parabéns.

    ResponderExcluir
  4. Daniel, Celamar e Marcelo, adorei ter apresentado Tereza a vocês. Que bom que gostaram, amigos!
    Beijos e obrigada.

    ResponderExcluir
  5. Diga por onde anda essa Tereza, que irei em busca dela sem guarda-chuvas.

    ResponderExcluir
  6. Que lindo, Evelyne, me lembrou o poema "Caso Pluvioso" do Drummond. Gostei muito.

    ResponderExcluir
  7. Maravilhoso, Evelyne! Eu conheço a Tereza! Beijos!

    ResponderExcluir
  8. "Matou a pau", como se diz aí em Natal, e arrancou-me lágrimas. Entre lindo e maravilhoso, prefiro classificar seu texto como esplêndido e perfeito. Evelyne, você não apenas desabrochou,mas fez explodir o seu, o meu, o nosso coração. Parabéns!

    ResponderExcluir
  9. Murta,Risomar, Sayonara e Mara, que bom ler seus comentários! Beijos e obrigada.

    ResponderExcluir